Universidade de Coimbra traduz e edita obra com 400 anos
O “Curso conimbricense”, obra de referência, escrita em latim e publicada pelos anos de 1600, vai ser traduzida e editada, em 20 volumes, pela Universidade de Coimbra (UC), anunciou hoje o reitor João Gabriel Silva.
Escrito em “difícil e denso latim filosófico”, que “muito poucos estudiosos contemporâneos conseguem consultar”, o “Curso conimbricense”, editado há mais de 400 anos (entre 1592 e 1606), vai ser traduzido para português e publicado numa edição bilingue latim-português e numa versão em inglês (que é “a língua franca dos nossos tempos”), disse hoje o reitor da UC, que falava na Abertura Solene das Aulas da instituição.
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O projeto, que João Gabriel Silva prevê demore “dois a três anos”, envolve a colaboração de “uma vasta equipa” de especialistas, liderada pelos professores da UC Mário Santiago de Carvalho, Sebastião Pinho e Margarida Miranda.
O “Curso conimbricense” consiste “num muito detalhado comentário das obras de Aristóteles, que constituíam na altura a base do ensino universitário em toda a Europa”, afirmou o reitor, referindo que o curso foi “adotado em todo o universo jesuíta e muito para além dele”.
“Estudaram por ele filósofos como Descartes, Espinosa, Locke, Leibniz, Hobbes e Peirce”, frisou João Gabriel Silva, adiantando que “está bem documentado” o uso “generalizado por toda a Europa, do Atlântico aos Urais” do “Curso conimbricense”, que foi publicado por “centenas de editoras de toda a Europa, com particular intensidade” no espaço alemão.
“Chegaram a existir versões contrafeitas, tal era a apetência do mundo académico por este curso”, destacou.
Tratou-se, “incontestavelmente”, de uma obra de “expansão planetária”, sustentou o reitor da UC, indicando que ela também foi traduzida para mandarim e para japonês e que há notícia de que também existiram versões em tâmil, na Índia e no Sri Lanka, e que foi geral o seu uso no Brasil e frequente na restante América Latina.
Mas “muito ainda se desconhece” sobre a sua expansão e influência, que ainda está por fazer, salientou João Gabriel Silva.
“A condição de obra de referência” do “Curso conimbricense” manteve-se até “muito tarde”, de tal modo que Karl Marx a considerou precisamente “de referência” para “a interpretação de Aristóteles”, na sua dissertação de doutoramento, em 1839 (dois séculos e meio depois, portanto, da sua publicação inicial), exemplificou João Gabriel Silva.
O “Curso conimbricense” resultou do facto de a Companhia de Jesus (então com sede em Roma) ter encarregado o Colégio das Artes de Coimbra de “desenvolver os métodos e os conteúdos a serem seguidos em todos os locais do mundo onde os jesuítas lecionassem”, recordou o reitor.
“Embora a herança jesuíta seja sentida como retrógrada, pela sua ancoragem na escolástica”, o período em que geriram o Colégio das Artes, entre 1555 e 1759 (data da sua expulsão de Portugal), foi de “enorme relevância internacional da UC”, de tal modo que ela seria colocada em todos os ‘top 10’ dos ‘rankings’ internacionais, se existissem na altura, sublinhou.
Ao disponibilizar, deste modo, o “Curso conimbricense”, a UC está a retomar, “por direito próprio, um lugar na primeira fila dos construtores da civilização intelectual tal como [é conhecida] hoje”, sustentou o reitor João Gabriel Silva.
Também assim – defendeu –, a UC reforça a justiça da sua classificação, em 2013, como Património da Humanidade, não só pelo “valor enorme do seu património físico”, mas também pela “conformação do modo de pensar coletivo, da cultura civilizacional”.
“Sem o contributo de Coimbra, o mundo não seria o mesmo”, concluiu.
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