Primeira Página
Um quarto dos investigadores precários da Universidade de Coimbra fica no desemprego em janeiro
Cerca de 270 investigadores da Universidade de Coimbra estão numa situação laboral precária, afirma grupo que tem procurado lutar contra este problema, alertando que 70 cientistas daquela instituição ficarão no desemprego já em janeiro de 2025.
Os 270 são investigadores que foram colecionando ao longo dos anos contratos precários, bolsas de projetos de investigação e outros vínculos de curta duração, dando também aulas e orientando teses de doutoramento sem receber qualquer remuneração por isso.
PUBLICIDADE
Steve Catarino, bioquímico de 44 anos, faz investigação desde 2002 na Universidade de Coimbra (UC), onde se doutorou em 2010, e, depois de mais de duas dezenas de anos ligado à instituição, verá o seu vínculo terminar no dia de Natal, sem saber se poderá continuar.
“E depois?”, pergunta à agência Lusa o investigador, referindo que, muito provavelmente, terá de concorrer a outros lugares, talvez noutros países.
Segundo o bioquímico, “depois de 22 anos na Universidade, sempre com avaliações positivas, é-se chutado para a rua”.
Steve Catarino é um dos cerca de 70 investigadores da UC que deverão enfrentar o desemprego entre dezembro de 2024 e janeiro de 2025 – outros deverão ter o mesmo destino ao longo do próximo ano.
São profissionais que tinham assinado contratos ao abrigo de uma norma transitória da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) ou de contratos de estímulo ao emprego científico que previa a possibilidade de serem integrados no quadro das instituições onde trabalhavam.
No verão, quando os concursos já deveriam ter sido lançados pela UC para essa integração, foi formado um grupo orgânico de investigadores que tem procurado lutar contra a precariedade que assola a profissão.
O combate à precariedade na ciência será o mote para uma manifestação, na sexta-feira, às 11:00, na Porta Férrea da Universidade de Coimbra, convocada por este mesmo grupo.
O grupo, que já teve uma reunião com a reitoria, tem compilado números que procuram mostrar a importância destes profissionais na UC.
Segundo dados enviados à Lusa, uma amostra que representa um quarto dos 270 investigadores contribuiu com 2.031 horas não remuneradas de serviço docente no ano 2023/2024, assegurou 366 orientações de mestrado e 145 de doutoramento e assegurou 8,6 milhões de euros em financiamento.
Diana Ribeiro Silva, que coordena o grupo e que trabalha na Faculdade de Psicologia, salienta que, além dos “70 investigadores que agora vão embora, há mais 20 até junho e até dezembro mais uns quantos”.
“Até ao final do ano letivo, um terço dos investigadores que está nesta situação fica sem contrato”, alertou.
No grupo, há investigadores com e sem perspetivas de integração, mas todos movidos por uma ciência “feita com dignidade e sem precariedade”.
“A não remuneração de horas [de serviço docente], a não vinculação na carreira e a precariedade criam uma imagem internacional de uma universidade que não acolhe e que perde investigadores excelentes”, vincou a investigadora.
Para Diana, “tem de haver uma solução de compromisso”.
“O problema não é só da Universidade de Coimbra. É preciso chegar-se a uma solução [com a FCT e Governo]”, defendeu.
De acordo com a investigadora, a contínua procura de novos projetos e novas bolsas para assegurar rendimento “é um sufoco enorme”.
“Isto tem de mudar que está a dar cabo de nós”, frisou.
David Vaz, de 43 anos, investigador especializado em geologia planetária, soma 18 anos de investigação ligada à Universidade de Coimbra, “com várias bolsas e várias tipologias de contrato”.
O seu contrato termina em maio.
“Ao fim dos seis anos e após avaliação periódica, era suposto que a UC abrisse concursos para as funções que nós desempenhamos”, explicou.
Face à sua situação e de muitos outros investigadores em todo o país, David Vaz acredita que o Instituto de Emprego “será o maior empregador de cientistas em Portugal” a breve prazo.
A agência Lusa tentou, sem sucesso, obter esclarecimentos junto da reitoria.
Related Images:
PUBLICIDADE