Opinião
TORRES FARINHA: Resiliência
O conceito de resiliência tem vindo a assumir uma importância crescente, quer no plano científico quer no prático. Porém, este não é um conceito novo, atendendo a que a essência da resiliência pode ser encontrada na expressão de Charles Darwin quando este diz que “[…] não são as espécies mais fortes que sobrevivem, nem as mais inteligentes; são aquelas que são mais adaptáveis à mudança”. A resiliência é pois a capacidade de algo voltar ao seu estado natural após alguma situação de desequilíbrio.
Uma pessoa resiliente é a que não evita os problemas a todo o custo, mas sim a que aprende a controlá-los e a transformá-los em soluções produtivas. A pessoa resiliente provavelmente dobrará, mas não quebrará, quando confrontada com a adversidade, traumas, tragédias e ameaças. A pessoa resiliente será sempre activa em relação ao que acontece à sua volta e ao mundo, acreditando ser a dona do seu presente e do seu futuro, e não uma vítima do seu passado.
No contexto da ecologia, a resiliência é a aptidão de um determinado sistema recuperar o equilíbrio depois de ter sofrido uma perturbação. A noção de resiliência ambiental ficou conhecida a partir de 1970, graças ao trabalho do ecologista canadiano C. S. Holling.
Do “Painel de Alto Nível do Secretário-Geral das Nações Unidas sobre Sustentabilidade Global (2012), Povos Resilientes, Planeta Resiliente: um Futuro Digno de Escolha”, foi elaborado um relatório que inclui uma “Carta, datada de 30 de Janeiro de 2012, endereçada ao Secretário-Geral, pelos co-Presidentes do Painel de Alto Nível sobre Sustentabilidade Global”, que começa com a seguinte frase: “Em 2030, uma criança nascida no presente ano tornar-se-á maior de idade. As nossas recomendações procuram estabelecer para ela, e para todas as crianças, um mundo no qual um crescimento sustentável e inclusivo proporcione mais por menos, para todos”.
De facto esta é a grande questão – não podemos esperar que as nossas crianças cresçam para resolver os nossos problemas, temos que ser nós a resolver os problemas delas, porque, entretanto, novos problemas surgirão. Até porque, segundo Mahatma Gandhi, “A Terra dá o suficiente para satisfazer as necessidades de todos os homens, mas não a sua ganância”, e este é, possivelmente, a base do problema.
O desenvolvimento sustentável deve corresponder a um processo dinâmico de adaptação e acção. Impõe-se agir nos entrosamentos entre a economia, a sociedade e a natureza. Apenas alguns países já iniciaram esta caminhada, mas o mundo ainda não está nesta senda; já houve progressos, mas não têm sido nem rápidos nem suficientemente profundos. Impõe-se encetar acções estratégicas de grande alcance, pois enfrentamos mudanças cada vez mais acentuadas. Impõe-se encontrar um equilíbrio de impacto nulo para a natureza que resulte da equação entre as variáveis produção, consumo, recursos utilizados, inovação, mudanças demográficas, mudanças na economia global, crescimento verde, aumento da igualdade, e mudança das dinâmicas políticas.
Quanto mais influente se for na sociedade, maior será o impacto potencial sobre o planeta e maior a responsabilidade nos comportamentos de forma sustentável. Isto é, a globalização e as pressões sobre os recursos naturais significam que as escolhas individuais podem ter consequências globais. Para muitos, no entanto, o problema não se limita às escolhas não sustentáveis, mas, principalmente, à falta de escolhas. A verdadeira escolha só será possível quando os direitos humanos, as necessidades básicas, a segurança e a resiliência humana forem garantidos. As áreas prioritárias de acção, segundo o relatório atrás referido, incluem:
O cumprimento dos princípios fundamentais do desenvolvimento – compromissos internacionais para erradicar a pobreza, promover os direitos humanos e a segurança humana e avançar na igualdade de género;
A promoção da educação para o desenvolvimento sustentável, e a criação de competências para ajudar a assegurar que toda a sociedade possa contribuir com soluções para os desafios actuais;
A criação de oportunidades de emprego para fomentar um crescimento verde e sustentável;
A educação dos consumidores para que possam fazer escolhas sustentáveis e promover o comportamento responsável, quer individual quer colectivo;
A gestão dos recursos e a possibilidade de uma revolução verde no século XXI – agricultura, oceanos e sistemas costeiros, energia, tecnologia, e cooperação internacional;
A adopção de uma atitude resiliente através de redes sólidas de segurança, redução do risco de desastres e de planos de adaptação.
Em 2009, um grupo de cientistas liderado por Johan Rockström do Centro de Resiliência de Estocolmo propôs uma estrutura de “limites planetários” para definir um “espaço operacional seguro para a humanidade”. A definição desta estrutura foi baseada em estudos científicos que evidenciaram que desde a Revolução Industrial que as intervenções humanas se têm tornado gradualmente o principal vector da mudança ambiental global.
Aqueles cientistas afirmam que, uma vez que a actividade humana ultrapasse determinados limites ou pontos de inflexão, definidos como “limites planetários”, há um risco real de “mudança ambiental irreversível e abrupta”.
No total, são identificados nove limites: mudança climática; taxa de perda de biodiversidade; fluxos biogeoquímicos (quer o nitrogénio quer o fósforo); esgotamento da camada estratosférica de ozono; acidificação dos oceanos; uso global da água doce; mudança no uso dos solos; carga de aerossóis na atmosfera; e poluição química.
Os cientistas estimam que a actividade humana parece já ter transgredido os limites permitidos pela natureza, designadamente a taxa de perda de biodiversidade e as mudanças no ciclo global do nitrogénio. Outras descobertas sugerem que a humanidade pode estar a aproximar-se de forma acelerada dos limites de interferência com o ciclo global de fósforo, do uso global de água doce, da acidificação dos oceanos e da mudança global no uso dos solos.
Apesar dos próprios cientistas sublinharem que as avaliações são estimativas iniciais, o seu trabalho representa uma mudança importante na importância dada a uma monitorização mais sistémica do impacto da humanidade sobre o seu meio ambiente.
Resta agora perguntar se vamos continuar a acreditar que a resiliência humana é supra natureza, ou que a resiliência da natureza é infinita, ou que o ser humano é parte da natureza e que a resiliência global é feita do equilíbrio entre as duas partes. Então temos que nos tornar pessoas resilientes, não evitando os problemas a todo o custo, mas sim aprender com eles e a transformá-los em soluções sustentáveis. Resiliência tem que se tornar uma prova de respeito para com a natureza e de respeito para com os vindouros – devemos isso ao futuro.
TORRES FARINHA
Investigador
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