A ameaça de novos processos laborais contra a TAP pode vir a ter impacto na futura privatização, podendo levar à redução do valor da venda, segundo especialistas ouvidos pela Lusa.
Em causa estão os mais de 700 processos de reintegração e pagamento de indemnizações a tripulantes de cabine da TAP, de situações entre 2005 e 2024, que estão prontos para dar entrada em tribunal, como disse à Lusa o presidente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC).
Segundo Ricardo Penarróias o número de tripulantes de cabine abrangidos pela decisão do Supremo Tribunal de Justiça “poderá andar à volta dos 2.000” e pode vir a ter custos para a companhia aérea entre 200 a 300 milhões de euros.
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Para o docente do ISEC e especialista em aeronáutica Rui Quadros, esta situação “pode, sim, ter impacto na privatização da TAP. Não por afastar os potenciais compradores [Air France-KLM, IAG e Lufthansa], mas porque pode levar à redução do valor de venda”.
“Decisões judiciais recentes já obrigaram a companhia a provisionar milhões de euros, o que penalizou diretamente os seus resultados. É natural que os interessados considerem esses riscos no momento de fazer uma proposta, exigindo garantias ou oferecendo menos”, acrescentou o antigo gestor da Iberia, PGA e SATA.
Ainda assim, Rui Quadros destaca que a TAP “mostrou solidez operacional em 2024, com receitas recorde e bom desempenho em mercados-chave, o que mantém o interesse internacional”.
Mas deixa o aviso: “A TAP não se pode prejudicar a si própria. A estabilidade laboral e a boa gestão interna são essenciais para proteger a sua valorização num momento tão estratégico como este”.
O consultor da SkyExpert Pedro Castro partilha da mesma posição. “Estes processos ganhos na última instância judicial leva o SNPVAC a crer que uma série de até 700 despedimentos ocorridos entre 2005 a 2024 possam seguir o mesmo caminho, de tal forma que TAP optou por fazer um aprovisionamento de 41 milhões de euros para os enfrentar”, lembrou.
O analista não tem dúvidas que “se este tema não ficar ‘fechado’ antes da venda, torna-se num ónus que, em sede de negociação do valor da TAP, servirá para o baixar certamente”, acrescentou.
Questionado sobre as expectativas para o resto do ano, Rui Quadros comentou que, para 2025, o foco da TAP “deverá estar na estabilidade laboral e no controlo de custos, para manter a atratividade junto a potenciais compradores e reforçar a sustentabilidade financeira”.
As expectativas para 2025 são de estabilidade moderada na procura, mas com pressão clara sobre a rentabilidade.
A Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) prevê uma queda global do ‘yield’ [receita de passageiro] de 3,4%, o que significa uma degradação da tarifa média por quilómetro voado.
“No caso da TAP, esse cenário é ainda mais delicado: com custos com pessoal já 13% mais alto em 2024 e potenciais novos encargos judiciais, o risco é que o aumento das despesas operacionais corroa completamente o valor médio da tarifa, anulando os ganhos obtidos com a eficiência da operação ou com o crescimento da procura em rotas estratégicas”, comentou Rui Quadros.
O verdadeiro desafio será preservar margens num contexto em que se ganha menos por passageiro e se gasta mais por voo. Gerir essa equação será essencial para manter a sustentabilidade do negócio, e a atratividade no processo de privatização”.
Por sua vez, Pedro Castro lembra que os atrasos das entregas de aviões estão a afetar vários concorrentes da TAP. E que “a TAP construiu uma enorme fortaleza tarifária que se chama Portela. É uma excelente proteção natural da tarifa perante uma procura que cresce e que é aproveitada apenas pelas companhias aéreas que já estão no aeroporto da Portela, nomeadamente a TAP que controla 50% dos movimentos de Lisboa”, acrescentou.
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