Cidade
Sem-abrigo há 10 anos reabilitam a sua futura casa em Coimbra
João e Honório são sem-abrigo há mais de 10 anos e começaram na segunda-feira a reabilitar a sua futura casa em Coimbra, com a ajuda da associação Hemisférios Solidários e de voluntários.
Eduardo Marques, diretor da associação Hemisférios Solidários, chegou à casa, na quinta-feira, por volta das 10:30, estando já João, um dos sem-abrigo envolvidos, à espera para trabalhar.
“O João é muito talentoso, sem ele não haveria obra nenhuma”, afirmou Eduardo Marques, explicando que se pretende utilizar “as competências e talentos” das pessoas ajudadas no desenvolvimento do projeto.
Desde o verão que a reabilitação de uma casa abandonada há mais de 15 anos em Coimbra estava a ser ponderada pela associação, tendo passado para a ação na segunda-feira, com os vizinhos “de acordo e disponíveis a ajudar”.
“Isto não é assistencialismo nem caridade”, avisou Eduardo Marques, referindo que o projeto é um ato de “resistência contra a inoperância do Estado e das autarquias” e uma forma de garantir o cumprimento do “direito à habitação de qualquer cidadão”.
O objetivo é que dentro de uma a duas semanas a casa já tenha janelas e portas para ser possível aos dois homens apoiados, Honório, sexagenário, e João, de 39 anos, e sem-abrigo há 15 anos, “algum conforto já durante o inverno, para depois, se possível, conseguir-se garantir água e luz para a casa”.
A associação trabalha neste âmbito desde 2011, pretendendo garantir a “autonomia e liberdade” de sem-abrigo, querendo “retirá-los da rua”.
Para isso, é também precisa “a ajuda da sociedade”, tendo recebido até ao momento “um saco de cimento, louça, madeira, vidro, mobiliário e uma banheira”, assim como o apoio de voluntários na restauração da casa.
Margarida Meireles, de 23 anos, e Diogo Brito, de 33, que se voluntariaram em ajudar, começaram o dia a carregar madeira para um sítio abrigado da chuva, para no futuro servir para se queimar e garantir algum aquecimento aos dois futuros habitantes da moradia.
“Temos tempo e é gratificante podemos dar o nosso contributo”, disse Margarida.
Há muito que fazer. A casa estava coberta de silvas e entulho, há janelas partidas, teias de aranha, cal a sair da parede gasta e com rachas, telhas em falta e teto estragado.
João já andou a escovar as paredes, apesar de ainda serem bem visíveis os grafites, e avisa que não se pode usar tinta na parede mas cal, “que se não estraga a parede”.
O sem-abrigo esmera-se enquanto delineia tarefas, como assentar janelas, repará-las, ver a medida das portas e o que se pode fazer na casa de banho.
“Com todo o gosto e todo o amor que ando aqui a reconstruir”, diz, visivelmente emocionado, com um cigarro na ponta dos lábios.
João começou “aos 15 anos nas obras” e essa experiência e conhecimento é uma mais-valia para a reabilitação da moradia.
“Isto agora vai pouco a pouco”, contou, lembrando também as dificuldades da reconstrução da casa apenas com um litro de tinta, uma pá, um rolo, um martelo e um carrinho.
“Já sinto que esta é a minha casa”, confidenciou João, compenetrado no arranjo de uma das janelas.
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