Opinião
Que futuro para Portugal
LÚCIA SANTOS
O envelhecimento da população é um dos traços estruturais mais marcantes das sociedades contemporâneas desenvolvidas, trazendo consigo problemas transversais nefastos, pelo que deve ser encarada como um problema político sério a ser assumido pelas políticas públicas.
Tal como nos países desenvolvidos, onde esta questão faz parte da agenda política e é debatida há já bastante tempo, numa busca constante de soluções, em Portugal este problema também não é propriamente recente, mas a plena consciência da sua gravidade só surgiu nos últimos anos, que revelaram os dados de natalidade mais baixos desde que há estatísticas oficiais sobre esta matéria (1935).
O envelhecimento populacional é um fenómeno controverso. Se, por um lado, constitui um notável progresso social, em muito resultante das melhorias ao nível das condições de vida, directamente relacionadas com a alteração dos hábitos alimentares e outros, com os progressos na medicina e com o sucesso das políticas de saúde (melhoria da assistência médica) e de protecção social (alargamento dos sistemas de apoio), por outro lado, juntamente com muitos outros factores, coloca em causa alguns dos equilíbrios financeiros e institucionais que sustentam essas mesmas políticas.
Na realidade, o grande problema associado ao envelhecimento da população não é o aumento da esperança média de vida, mas o decréscimo dos nascimentos, pois se estes se mantivessem em valores equilibrados, estaríamos apenas perante uma sociedade de pessoas que vivem mais tempo e não de uma sociedade envelhecida. Neste caso haveria apenas que adaptar a sociedade a uma nova, mas boa, realidade, resultado do desenvolvimento económico e social. Mas não é isto que acontece e, na verdade, estamos perante um fenómeno de duplo envelhecimento populacional.
Foi no ano de 2000 que pela primeira vez o número de jovens em Portugal foi superado pelo número de idosos e, mantendo-se esta tendência, prevê-se que em 2050 cerca de 80% da população portuguesa apresentar-se-á envelhecida e dependente e que a idade média poderá situar-se próxima dos 50 anos.
As razões justificativas deste declínio continuado da taxa de natalidade e deste aumento crescente da esperança média de vida são várias, abrangendo questões de natureza cultural, social, económica e financeira, e os impactos estão e continuarão a fazer-se sentir, igualmente, nestas diferentes esferas, sendo os seus efeitos, potencialmente, cada vez mais graves.
Por estes motivos, e embora a demografia não seja um problema político clássico, esta condiciona de uma forma muito significativa uma representativa parte das políticas públicas.
Com excepção das consequências evidentes ao nível da mudança dos modelos de vida e de consumo, as áreas que mais directamente são afectadas com este problema são a segurança social e a saúde, estando actualmente em causa a manutenção do Estado Social como todos o conhecemos. De facto, paralelamente ao envelhecimento da população e consequente acréscimo do coeficiente de dependência de idosos assiste-se ao crescimento dos encargos sociais com as reformas/pensões e a assistência médica e à crescente dificuldade de cobrir os encargos daí derivados com recurso a um número cada vez mais reduzido de contribuintes. Deste modo, não só fica em causa a sustentabilidade do sistema de segurança social e o funcionamento do serviço nacional de saúde, mas igualmente a estrutura da despesa pública, sobrecarregada com a necessidade de aumentar os gastos com apoios sociais e serviços de saúde associados às populações mais idosas.
Mas para além destes efeitos, esta situação tem ainda reflexos na educação, no emprego, na legislação laboral, na competitividade da economia e na política de imigração, entre muitas outras áreas.
Por último, observam-se ainda consequências ao nível do ordenamento e planeamento do território, desde a organização administrativa, às estratégias de desenvolvimento, passando pelo planeamento das infra-estruturas (nos domínios do saneamento básico, da rede eléctrica, das comunicações, dos transportes, entre muitos outros) e dos equipamentos colectivos (nos domínios da administração, da educação, do desporto, do social, da saúde, da justiça, entre muitos outros), quer em termos de número, quer em termos de distribuição espacial.
Tal como o problema se faz sentir em diversas esferas, a solução tem de passar também por uma intervenção nas suas diferentes dimensões, pois de outra forma não se atingirão os resultados esperados.
Todo e qualquer debate que se pretenda fazer sobre o futuro de Portugal tem de ter estes dados como ponto de partida. Temos um Estado Social, uma rede de infra-estruturas e de equipamentos colectivos e uma divisão administrativa pensados para o país de ontem e precisamos urgentemente de pensar o país de amanhã.
LÚCIA SANTOS
Presidente da Juventude Popular de Coimbra
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