Cidade

Pichagens fazem parte da paisagem da Coimbra da UNESCO

Notícias de Coimbra | 7 anos atrás em 14-05-2018

As pichagens na Alta de Coimbra não são recentes, mas nos últimos anos tem-se assistido a uma proliferação de mensagens, ‘tags’ e rabiscos que já afetam o criptopórtico romano, a Sé Velha e a Igreja de São Salvador, uma das mais antigas da cidade.

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Imagem Rodrigues Costa

Murais e frases com mensagens políticas, muitas vezes associadas a lutas estudantis, fazem quase parte da identidade da Alta, seja nas paredes que acompanham o percurso até à Universidade, nas Repúblicas ou nas paredes laterais das próprias faculdades.

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No entanto, hoje em dia, para além dessas mensagens, surgem ‘tags’, rabiscos e frases apenas provocatórias – “Faltava aqui cor” -, que tanto proliferam nas fachadas de casas de privados, como em monumentos do Centro Histórico da cidade.

As paredes brancas da zona nova do Museu Nacional Machado de Castro (MNMC) estão repletas de frases de toda a ordem, a zona exterior do criptopórtico romano também já foi atingida, assim como as paredes originais da Sé Velha, mandada construir por Afonso Henriques, e que foram alvo de limpeza por parte da Câmara de Coimbra.

O caso mais evidente do descontrolo acaba por ser a Igreja de São Salvador, do início do século XII e situada junto ao Machado de Castro, onde estão desenhadas caveiras nas portas e inscritas várias frases e ‘tags’ na sua fachada, uma delas onde se lê “A Igreja que ilumina é a igreja que arde”.

Desde a reabertura do MNMC, em 2012, que a diretora começou a observar várias pichagens nas paredes do museu.

“Sentimos que têm vindo a agravar-se estas descaracterizações, este lixo visual, que é esteticamente muito feio para todos nós e para a cidade. É revoltante ver o que se faz com o património”, disse à agência Lusa a diretora do MNMC, Ana Alcoforado.

Ali, já perdeu conta às vezes que as paredes foram pintadas de novo e as várias campanhas de sensibilização que o museu tentou fazer ao longo dos anos não surtiram qualquer efeito.

“Já não é uma questão só de sensibilização. É preciso medidas mais duras e é necessária uma estratégia concertada das várias instituições para resolver este problema sério”, vincou, defendendo uma ação de vigilância e punição “que não existe neste momento”.

Também o reitor da Universidade de Coimbra afirma que se está num momento “de intensidade elevada”, sendo que a instituição tem que ter sempre “um piquete pronto para pintar sobre as pichagens”, vendo-se normalmente as paredes remendadas com esse trabalho.

Para João Gabriel Silva, uma ação de investigação da PSP, com a identificação dos autores e a sua condenação “a pagar os estragos que causam” seria “um fator dissuasor suficiente”.

“A sensação que fica é que não acontece nada”, sublinha Pedro Gonçalves, guia intérprete há mais de 20 anos em Coimbra, apontando para um ‘tag’ nas paredes da Sé Velha, “que não foi feito há um mês, mas no final de 2017 e lá continua”.

O problema, sublinhou, “não é só de quem teve a falta de sensibilidade ao património para fazer isto, como a resposta das instituições locais, que porventura até terão tentado fazer alguma coisa, mas, de concreto, nada foi feito”.

Para outro guia turístico, Tiago Boavida, as pichagens são um símbolo de “uma questão mais global, que é a degradação da Alta”.

Para resolver o problema, sugere que as entidades locais devam ter equipas que, “às 07:00, viam o que estava pintado e pintavam por cima, em casas de privados ou edifícios públicos”, acreditando que, desta forma, conseguiriam vencer os autores pelo cansaço.

Uma estudante da Universidade de Coimbra que fazia ‘stencils’ e pichagens, sempre de conteúdo político, disse à agência Lusa que não havia um critério sobre os espaços escolhidos para pintar, mas nunca fez na Igreja de São Salvador ou nas paredes das casas das vizinhas, na Alta de Coimbra.

“Tínhamos um certo controlo”, nota, criticando também a política da universidade, já no século XXI, de começar a apagar “uma série de murais muito antigos”, criando vários quadrados e retângulos brancos nos muros e paredes da instituição.

Essa estratégia da universidade simbolizava uma certa “censura” e levou a uma reação de se pintar por cima desses quadrados e retângulos brancos, explica.

Apesar disso, nota que a situação na zona do Largo de São Salvador ficou “mais descontrolada”.

“Não sei se vejo isso como inconsciência ou infantilidade, mas também não vejo como um ato consciente. Não há vontade de criar discussão pública” com parte das pichagens que são feitas hoje em dia, sublinha.

Uma outra antiga estudante da Universidade de Coimbra que fazia jogos de palavras e frases de teor político e social nas paredes da Alta considera que as paredes do espaço universitário eram usadas como forma de ocupação de um espaço que deveria ser “de conversação”.

“Aconteceu-me muitas vezes apagarem as frases. Mas isso depois convidava a que fosse novamente pintar por cima”, explica à Lusa a antiga estudante.

Admitindo que o tema é complicado e controverso, reconhece que há trabalhos “em que é sujidade só para sujar”, sem qualquer perspetiva de intervenção.

“Este caos visual acaba por afastar muitas pessoas para compreender e aceitar” as pichagens, reconhece.

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