Opinião
Perdemos! Vitória!
(Caro leitor, permita-me deixar já este aviso: se acha que a devoção acrítica à Seleção da Federação Portuguesa de Futebol é uma medida razoável do patriotismo de cada um, este texto não é para si. Pode parar de ler.)
Acompanhar um jogo de Portugal em público tornou-se um suplício.
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Um grupo de adeptos sentados em frente a um televisor parece mais uma seita do que uma claque, partilhando momentos de êxtase e de fé, que para aqueles que observam de fora constituem momentos de estupefação e incredulidade. Chegam a ter comportamentos mais fervorosos do que aqueles seguidores do presidente da Câmara Municipal de Coimbra no Facebook que, assim que alguém faz um comentário que não seja um entusiasmado elogio, soltam as garras metafóricas no teclado.
O expoente máximo desta idolatria de cachecol vermelho e verde (com toda a probabilidade, com o nome de uma cervejeira inscrito) ao pescoço é, evidentemente, a idolatria com Cristiano Ronaldo. Nas pouquíssimas vezes em que me permiti partilhar com desconhecidos o visionamento de uma partida da Seleção, vi e ouvi de tudo: gritos de «Siiiiiii» que se prolongam e prolongam e prolongam quando o jogador do Al Nassr faz um passe a meio-campo, urros de «GOAT! GOAT! GOAT!» quando que ele aparece no televisor e incentivos como «Vai, pai!» sempre que surgia uma eventual oportunidade de golo.
Os únicos locais onde a febre com a Seleção e com Ronaldo é mais elevada do que nos cafés e nas esplanadas é nas redações e nos estúdios de televisão. Não faltam os jornalistas e comentadores que nos garantem que o país que já tem a melhor gastronomia, os destinos turísticos mais excitantes, o clima mais agradável ou os monumentos mais imponentes, tem também os mais talentosos jogadores da atualidade e o melhor de sempre. Fazem-no – eles, tal como todos os que nos asseguram a veracidade dos demais ‘galardões’ – com um entusiasmo pueril, o qual, se eu fosse cínico, classificaria de falta de mundo.
Diria que inevitavelmente, esse entusiasmo transforma-se em depressão a cada derrota. E é nessas alturas que ficamos a saber que, afinal, os nossos futebolistas não seriam titulares na última equipa do ranking da FIFA e que Ronaldo não chega aos calcanhares de Carlos Kaiser, o brasileiro que passou pelos principais clubes brasileiros e alguns estrangeiros sem disputar praticamente nenhum jogo. Vai a ver-se e o cozido à portuguesa afinal não é nada de especial, as nossas praias são muito ventosas, os invernos são muito frios e os Jerónimos são um mamarracho!
Perante tudo isto, é inevitável concluir: acompanhar um jogo de Portugal em público tornou-se igualmente um suplício.
Felizmente, Portugal perdeu com a França nos quartos-de-final do Campeonato da Europa. Para quem gosta de futebol, isso é uma boa notícia.
OPINIÃO I PEDRO SANTOS- ESPECIALISTA EM COMUNICAÇÃO
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