Coimbra

Pedro Roxo: Ainda vejo muita mesquinhez e desejo pessoal de protagonismo

Notícias de Coimbra | 4 anos atrás em 25-10-2020

Em  entrevista exclusiva ao Notícias de Coimbra, o presidente da Associação Académica de Coimbra – Organismo Autónomo de Futebol (AAC/OAF)  aborda os principais temas da atualidade da instituição.

Pedro Roxo aceitou responder às questões que marcam a vida da Briosa e fala sobre a equipa, a SAD, o BMG, a situação financeira e os processos judiciais.

Nesta época de pandemia, o  também líder da Sociedade Desportiva Unipessoal por Quotas (SDUQ) da Académica, lamenta que ainda exista na universalidade académica muita mesquinhez e desejo pessoal de protagonismo. 

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Notícias de Coimbra (NDC) – O que se pode esperar deste plantel da Académica?

Pedro Roxo (PR) – O valor do orçamento é dos mais baixos da Segunda Liga. Já assumi que Académica não era candidata, mas não está a ser um mau início. Aliás, em termos desportivos, mesmo com as dificuldades temos conseguido bons resultados. Nunca tivemos orçamentos altos, comparados com os outros e andamos sempre lá acima. Conseguimos, ao fim de alguns anos de trabalho, ganhar credibilidade na liga e conseguir que pudesse ser aberta outra vaga de acesso, através de play-off.

NDC – Quais os objectivos para esta época tão especial?

PR – O objectivo é vencer todos os jogos. e é também equilibrar as contas. Mas ainda assim a Académica tem um excelente plantel, uma equipa muito competitiva e um grupo muito unido. Já jogámos com candidatos assumidos e não fomos inferiores. O que queremos sempre são vitórias e a Académica continua sempre a ser o alvo a abater na 2ª Liga. O nosso orçamento baixou, mas a nossa exigência não.

 

O facto de sermos uma SDUQ estrangula as hipóteses de obtenção de investimento”

 

NDC – A Académica tem alguns processos em tribunal. O que se passa com a universalidade BMG e antigos dirigentes?

PR – É importante que os sócios se apercebam do esforço que diariamente é feito para tentar cumprir com todas as obrigações. A má situação financeira da Académica não vem de hoje. É importante que as pessoas saibam que quando entrei na direcção encabeçada pelo Dr. Paulo Almeida, as contas estavam a zero. A equipa não estava inscrita e havia muitas obrigações a pagar em poucos dias para conseguir inscrever a equipa. Depois, a cada dia que passava a situação tornava-se mais difícil. Só para ter uma ideia, os encargos com o plantel profissional ascendiam a mais de 2 milhões de euros, com receitas de 600 mil da televisão. O CCT entre a Liga e o Sindicato dos jogadores prevê que possa haver uma redução dos vencimentos em caso de descida de divisão. Nenhum atleta da Académica tinha essa cláusula no contrato. Por outro lado, os bancos, hoje em dia, não emprestam dinheiro aos clubes. Só adiantam as receitas da televisão, o que obriga os clubes a procurarem outras fontes de investimento. O facto de sermos uma SDUQ estrangula as hipóteses de obtenção de investimento. É claro que há recursos que podem ser optimizados para angariar maior receita, mas esse acréscimo é insuficiente para resolver todos os problemas. Todos sabem que o BMG mostrou interesse em entrar na Académica e essa declaração de intenção teve uma expressão pecuniária. Nunca escondemos nada, essa verba está no relatório e contas e é do conhecimento dos sócios há mais de um ano. Estou convicto que chegaremos a um entendimento. Mas se não chegarmos, defenderemos os interesses da Académica nas instâncias próprias. Até porque o financiamento era uma parte do negócio, não era todo o negócio. Agora, a verdade é que este processo resulta de uma série de necessidades e da situação difícil em que vivemos. Sentar-nos-emos todos à mesa muito em breve para discutir todas as questões.

Quanto ao processo dos ex-dirigentes, é sinal de que a situação actual já vinha de trás. Aliás, as receitas da televisão foram dadas em garantia nesses processos de divida as finanças que estão a ser pagos por nós. Mas aquilo que as pessoas têm que ter consciência é que neste momento o futebol é um negócio. É um negócio que custa muito dinheiro, que a Académica não tem. Vemos clubes com apoios variados e com inúmeras fontes de rendimento. E quem apoia a Académica? Quem ajuda a Académica?

Para além disto, temos visto serem empolados determinados assuntos por determinados protagonistas que o fazem sempre que a Académica está bem desportivamente. Mas não o vamos tolerar. Basta de andar a deitar abaixo o trabalho de todos aqui dentro. Numa altura de grande dificuldade (nossa e de todos pela situação que vivemos) há alguém sempre que quer é destruir quem se supera nestes momentos. Penso que é altura de percebermos isto de vez. Não podem ser postos em causa os valores e ADN da Académica por interesses pessoais. Faz-me muita confusão verificar que existe sempre um ruído enorme e que só é mesmo isso. Ruído. Chego muitas vezes a pensar até que ponto algumas pessoas querem mesmo uma Académica forte. Ainda vejo muita mesquinhez e desejo pessoal de protagonismo. A Académica não é nem serve para dar protagonismo a ninguém. Mas a equipa não se vai deixar afectar. Este grupo sabe o que quer, que é o melhor para a Académica.

NDC – O banco BMG ainda pode vir a ser parceiro da Académica?

PR – Veremos. Qualquer solução depende única e exclusivamente dos sócios.

 

É preciso que todos percebam que os tempos mudaram e nós temos de acompanhar a evolução”

 

NDC – A situação financeira da Académica não é famosa desde o século XX. Quer fazer um ponto da situação dessa “herança”?

PR – A Académica está numa situação difícil, o que nunca escondemos. As duas direções que integrei, desde 2016, sempre actuaram de uma forma muito abnegada, abdicando de muito de si para honrar os compromissos da Académica coisa que para nós é vital, sendo que por vezes temos situações altamente complexas principalmente no domínio da tesouraria. Hoje é comum ouvir que o futebol é uma indústria. E é. A gestão da académica tem de ser altamente profissional alicerçada numa visão estratégica que se apoia nos valores, na história e na vontade de vencer. Estamos na altura de dar esse salto definitivo. É preciso que todos percebam que os tempos mudaram e nós temos de acompanhar a evolução. Mas sem nunca perder o passado e os valores essenciais da Académica. Além disso, há muita dificuldade em conseguir formas de financiamento. E as ajudas na região centro, com excepção de algumas empresas, escasseiam. E isso é o que mais custa, porque hoje se verifica uma distância muito grande entre a Académica e o resto das instituições. Temos de inverter.

A Académica representa uma cidade a todo lado onde vai e quanto mais somos vencedores e tidos como exemplo para os jovens e mesmo para tudo o que gravita à nossa volta. Uma Académica vencedora e robusta financeiramente impõe um estilo e esse estilo repercute-se na forma como as outras regiões vêm a nossa. Isto é muito importante. Se tivermos todos essa capacidade de nos unir será único para nós. Temos de querer ser respeitados e admirados. A força e vitalidade das nossas instituições é a força e a vitalidade da nossa região. A qualidade das pessoas existe, a qualidade das instituições também. A académica é uma Instituição muito importante não só em Coimbra e na sua região como no país. Um Marca com um potencial incrível. É esta Marca, a Marca Académica, que temos de potenciar e com ela gerar resultados financeiros que por consequência se irão repercutir nos resultados desportivos.

Não devemos ter receio de crescer. E a Académica precisa de crescer porque as exigências financeiras são cada vez mais apertadas. E esse crescimento, não tenho dúvidas nenhumas será bom para todos. O rigor na despesa não é suficiente para, nem sequer a médio prazo, conseguir começar a equilibrar as contas. Espero, em breve, em AG que irá ser pedida pela direção ao Presidente da Mesa, expor a situação financeira da Académica, para que os sócios saibam o que temos feito e o quais as soluções. Estou em crer que neste momento existirão já formas (cumprindo a lei) para que possamos reunir com os sócios.

NDC – Como é que a pandemia afetou a Académica?

PR – As perdas são incalculáveis. Nomeadamente em transferências que não se realizaram. Para além disto, a suspensão do contrato da TV, perda de receitas com camarotes e bilhetes. São centenas de milhares de euros, a juntar aos prejuízos com o Leslie e com as inundações da Academia. Além do dinheiro, que é importante, jogar sem a presença dos nossos adeptos, que têm sido incansáveis e demonstrado que estão com a Académica sempre. Eles são a razão de ser desta instituição. É por eles que todos os dias eu e a minha equipa damos tudo o que podemos e ficámos muito sensibilizados com o apoio humano que nos deram quer no Leslie, quer nas inundações. Essa entreajuda, o remar para o mesmo lado tendo em vista o bem comum é precisamente o nosso objectivo.

NDC – Esta direção apresentou-se a eleições anunciando que iria avançar para uma SAD, isso esbarrou na intransigência da Direção-Geral da AAC em ceder o símbolo a uma SAD onde a Académica não fosse detentora da maioria do capital. Ainda é vossa intenção apresentar uma SAD nestes moldes?

PR – Nós sempre fizemos e sempre faremos o que consideramos ser melhor para a Académica. Se essa for a única solução, sim, será apresentada. Gostaríamos de o fazer num ambiente de harmonia com a DG, com os sócios e com todas instituições de Coimbra. Mas, à data de hoje, essas condições não estão criadas e preferimos explorar outras opções.

 

Entendemos que uma SAD é a solução que criará viabilidade à Académica”

 

NDC – É sua intenção apresentar um outro tipo de Sociedade Anónima Desportiva (SAD)?

PR – A instituição necessita de liquidez. Tem que entrar dinheiro. E alguém o dá, ou é emprestado. Todos sabemos que desde há uns anos foi cortado o crédito às sociedades desportivas pela banca em Portugal e vemos os clubes com maior estrutura a ter de recorrer à banca no estrangeiro. Assim, resta uma terceira via… procurar um parceiro que possa injectar capital. Entendemos que uma SAD é a solução que criará viabilidade à Académica. Mas como disse temos de olhar para a gestão da Académica como olhamos para uma gestão de uma empresa. Qualquer empresa sem tesouraria e capacidade de investimento não tem viabilidade. Penso que é altura de percebermos isto de vez. Volto a frisar que comigo nunca será permitido que alguma vez sejam postos em causa os valores e o ADN da académica. É tempo de falarmos sem rodeios. A Constituição de uma SAD é no meu entender a curto prazo a solução mais viável, se não a única, para o que referi anteriormente. A forma como a constituímos é lógico que tem de ser discutida entre todos. Mas temos de o fazer.

NDC – É possível haver um investidor que aceite ser minoritário, é que isso não é prática comum no futebol?

PR – Eu creio que é possível. Com todo o respeito pelos demais, a Académica não é um clube qualquer. É uma instituição diferente e especial pelo que também poderá ter parceiros especiais e específicos que encaixem numa parceria incomum. É possível haver um investidor que aceite ser minoritário, é que isso não é prática comum no futebol? No final, vai sempre depender dos sócios, e deles também depende o futuro da Académica. Temos de entender de uma vez por todas que estar sempre a atacar a Académica só a prejudica a todos os níveis. A Académica unida consegue ou conseguirá algo que ninguém imagina.

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