Opinião

Natal e a Síndrome de Estocolmo

Notícias de Coimbra | 11 meses atrás em 24-12-2023

Então, pá, não foste ao jantar de Natal da empresa? Nem sabes o que perdeste, digo-te só! Valeu bem o dinheiro que dei, sim, porque isso de ser o patrão a pagar estes momentos já é coisa do século passado, não é? E faz sentido, porque o importante é mesmo sermos uma equipa, ele tem razão quando diz que temos de vestir a camisola – olha, disse-o outra vez no jantar, mas ele já estava meio tocado e eu também, não sei bem se foi isso que ele disse…

Mas então, porque é que há-se ser o patrão a pagar para sermos uma equipa, não achas? Aposto que o Ronaldo paga a sua refeição quando vai jantar com os colegas, não é? Bem, com o dinheiro que ele ganha de certeza que não lhe faz diferença, até pode ir todos os dias àquele gajo que mete ouro para cima dos bifes, ou lá o que é… A mim custou-me um bocado a despesa, porque a receber o ordenado mínimo não há grande margem para festas, mas o patrão também não tem culpa disso, certo?

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Ainda tive de pedir à minha sogra para ficar com os miúdos, porque a minha mulher também trabalha na empresa, tu sabes, e ela até me fez má cara, porque no dia a seguir tinha de se levantar cedo porque tinha uma consulta e não sei o quê. Parece que anda com uns problemas na coluna, está cheia de dores há imenso tempo, mas eu disse-lhe logo que se deixasse de tretas, tinha de ficar com os netos porque a família é o mais importante e nós lá na empresa somos uma família, não é?

Bem, mas lá fomos quase todos – a doutora dos recursos humanos também tinha avisado que não era obrigatório, mas que já tinha havido poucos inscritos para aquela cena do team building antes das férias de verão e que esperava que não se repetisse… Mas de certeza que não foi por isso que apareceu tanta gente, é que é mesmo importante termos estes convívios, para depois podermos produzir mais, não é? Se calhar, se eu não andasse tão cansado por ter de levar trabalho para casa todos os dias, produzia ainda mais. Mas tem de ser assim, porque desde que despediram aquelas pessoas todas no ano passado – não te lembras? foi na altura em que soubemos que os administradores iam receber aquele bónus pelos bons resultados… E pronto, como eu estava a dizer, já sabemos que nestas alturas de dificuldade temos todos de dar mais um bocadinho.

Houve alguém, no jantar, que disse uma piada qualquer, assim baixinho, sobre estarem a servir lombo quando estava ali tanto cordeiro para o sacrifício, mas eu nem prestei muita atenção, porque estava a ver a Rita das fotocópias a dançar com o Tavares, que agora é coordenador… acho que ele ainda não lhe disse que vai ser despedida… mas pelo menos divertiu-se um bocado antes de ir para o desemprego, que a vida também não pode ser só desgraças!

Já te disse que o patrão bebeu demais? Eh pá, nunca o tinha visto assim! Bem, nem assim, nem de outra maneira, que ele raramente aparece lá na empresa e, quando aparece, só fala com os coordenadores. Mas pronto, gostei muito de o ouvir, disse que éramos todos muito importantes para ele e para os outros diretores todos. E acho que era verdade, porque eles, que estavam todos sentados à mesma mesa, acenaram que sim com a cabeça. E depois até distribuíram uns prémios de Trabalhadores do Ano… Trabalhadores não, Colaboradores do Ano! Foram todos para as chefias, mas de facto é merecido, porque senão, não eram chefes, não achas?

Mas então, é muito positivo termos estes momentos mais descontraídos, não é? O Dr. Vasconcelos, da sede, até me disse para estar à vontade e tratá-lo por Dr. Miguel, mas nem consegui, porque depois um dia destes cruzo-me outra vez com ele e sai-me um «Como está Dr. Miguel?» e não parece bem

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Olha, vê lá se no próximo jantar não falhas! E já agora, não te esqueças de preencher o questionário de satisfação que eles estão a passar até ao final do ano! Nunca fazem nada com aquilo, já sabemos, mas é a nossa obrigação, não é?

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