Portugal
Morreu Ricardo Monis, criador da coleção Ricky, o menino que anda de cadeira de rodas
O sociólogo Ricardo Monis, autor da série de livros infantis Ricky, morreu na terça-feira, 14 de maio, aos 25 anos, anunciou hoje a sua editora.
Ricardo Monis, portador de atrofia muscular espinhal tipo II, uma doença neuromuscular degenerativa, “era um exemplo de vida e de força de vontade”, escreve a Suricata Editora, na mensagem enviada à agência Lusa.
Nascido em Setúbal, em 20 de agosto de 1998, “Ricky, como gostava de ser chamado”, é um dos criadores da coleção Ricky, que começou a ser editada no ano passado, uma série dedicada a um menino que tem todas as preocupações comuns às crianças da sua idade, e que anda numa cadeira de rodas.
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“Mas não é isso que o impede de jogar futebol. Trata-se de uma das suas características, tal como a sua perspicácia e o seu sentido de humor. Os restantes jogadores terão outras características e é da união de diferentes competências que se faz uma grande equipa”, lê-se na apresentação do primeiro volume de “Ricky”, “uma história autobiográfica sobre inclusão, ou melhor ‘não exclusão’.”
Ricardo Monis licenciou-se em Sociologia pelo ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), um curso que o ajudou a desenvolver projetos como as histórias para crianças, como afirmou, quando da publicação do seu livro. Foi diagnosticado aos seis meses, e andava numa cadeira de rodas desde os quatro anos.
Num perfil publicado na primeira pessoa pela revista Visão, em março de 2023, confessou “depender de terceiros para tudo”, mas tal facto nunca o limitou: “Os limites só existem na cabeça de quem os cria.”
“Apesar da sorte que tenho tido com as pessoas com quem convivo, ainda noto algum constrangimento, principalmente ao nível da interação inicial”, disse Ricardo Monis à Visão. “Julgo que isto se deve sobretudo à falta de representatividade das pessoas com deficiência. Muitas vezes, quando são expostas, estão associadas ao carimbo de ‘coitadinho’ ou de ‘herói’. Nada disto nos ajuda a avançar e são posturas que criam uma barreira para que sejamos vistos com maior relevância.”
As primeiras tentativas de arranjar emprego foram difíceis, mas encontrou trabalho numa consultora, na área de Estratégia de Talento e, segundo a sua editora, “tinha acabado de ingressar” numa outra consultora internacional.
A série Ricky, que escreveu com o primo Lucas Chipenda e o ilustrador Nuno Salvada, permitiu-lhe ir a escolas, universidades e empresas, partilhar a sua história, “com o objetivo de demonstrar que os mitos só existem para quem os promove”, disse à Visão. “As crianças têm imensas perguntas e dúvidas sobre a cadeira de rodas e […] as minhas rotinas diárias. Deixo-as perguntar o que quiserem, pois acredito que o segredo para o mundo inclusivo está na educação.”
A falta de acessibilidades era “um enorme problema” sempre referido por Monis. “O país não está preparado para pessoas com necessidades especiais.”
“Claro, nem todos os dias são um mar de rosas – por vezes sinto-me frustrado e cansado, mas sinceramente, queixar-me não faz parte do meu estilo (só quando tenho de acordar cedo!)”, escreveu numa das suas últimas mensagens no Instagram. “Escolho encarar cada obstáculo com um sorriso no rosto (ou pelo menos com uma cara de parvo, vá!), porque […] a vida é demasiado curta para perder tempo a lamentar o que não podemos controlar. Em vez de me focar no que não posso fazer, prefiro celebrar cada pequena vitória.”
“Portanto, se me vires a fazer manobras radicais na minha cadeira de rodas pela rua, fica a saber que estou apenas a provar que a vida com atrofia muscular espinhal pode ser cheia de adrenalina e alegria (ou simplesmente perdi o controlo da cadeira)”, prossegue o criador de Ricky. E conclui: “Esta jornada não é um mar de rosas, mas as melhores estradas são aquelas cheias de curvas, não achas?”
O segundo volume da coleção Ricky será publicado no outono deste ano. Ricardo Monis chegou ainda a concluir o texto de um terceiro volume, anunciou a editora.
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