Opinião
Memórias do ANO VELHO
Na primavera estive em Nova Iorque e assisti a um concerto da New York Philharmonic, no Great Lawn, Central Park. Sem dúvida, um dos momentos mais impressionantes que já vivi ligado à música. Estava cercada por uma multidão que parecia inevitavelmente comigo. Como se estivesse a ver algo pela primeira e última vez, era tão absurdo quanto perfeito, sentia o corpo anestesiado e aquela cena ressuscitou em mim a ânsia de viver algo semelhante.
A rapsódia “August’s” fez o chão se mover sob os nossos pés, flutuávamos, éramos iguais – naquela selva de pedra -, iguais na emoção, no trato com a Arte e na substância da qual fomos feitos.
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Nem sempre avistamos o mesmo horizonte, mas, consigo imaginar uma realidade que não seja tomada pelos extremos como (oito ou oitenta). Aprendi com a arte a necessidade de ver o outro, sem a pressa que nos esvazia, sem a régua que nos divide e sem a rigidez da intolerância – porque teve um momento naquele parque, que todos queriam experimentar a temperatura da água do lago.
Os olhos, mesmo inundados, retidos num céu donde voavam pardais, o azul e a dança dos pássaros, uníssonos, era a imagem que me transportava para outros lugares, sem mover a minha alma. De facto, experimentei muita coisa na vida que me desse tal contentamento e a Arte tem um papel fundamental nessa história, é a minha combinação harmoniosa entre o doce, o cítrico e o amargo.
Eu assumo que sou condescendente com a felicidade, essa alegria instantânea que vem e vai com o batimento cardíaco e pupilas dilatadas. Escrever, foi a forma que encontrei de manter a memória acesa para descrever quais eram as nuances de azul do céu de primavera e a delicadeza de uma manifestação simples, o amor.
Sei que a vida quando injusta é esse “quase” paraíso com dores e delícias. Não é compreensível que em muitas partes do mundo – no ocidente e oriente – haja gente morrendo nas guerras, em contraponto ao que acontece na primavera em Nova Iorque, ou em outro sítio, quando se tem o privilégio de existir com Arte.
É uma pena, muitos homens e mulheres cresceram sem saber qual era a cor do cavalo branco de Napoleão.
Os anos e as memórias valem os dias em que fomos ou ainda seremos felizes, calculo que isso aconteça entre os dias e as noites, os livros e as colheitas, um manifesto em que nos comportamos como parte da orquestra, quando e onde a Arte foi o bastante para reconstruir a inefável esperança.
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