Coimbra
Mais portugueses e mais noites reservadas relançam turismo no interior Centro
Os empreendimentos turísticos do interior centro do país, essencialmente de pequena e média dimensão, estão a receber mais turistas portugueses, que ficam mais noites seguidas, em busca de locais isolados e seguros face à pandemia de covid-19.
De acordo com diversas fontes do setor ouvidas pela agência Lusa, a opção por fazer férias no interior, ao invés de destinos no estrangeiro, após meses de confinamento devido ao novo coronavírus, levou ao aumento do número de famílias que procura a segurança dos destinos com menor densidade populacional, tendo sido batidos recordes de ocupação em junho e julho.
O presidente do Turismo Centro de Portugal (TCP), Pedro Machado, confirma esta tendência, sustentando-a com números: a média de noites reservadas no total das oito comunidades intermunicipais (Região de Aveiro, Viseu Dão-Lafões, Região de Coimbra, Serra da Estrela, Região de Leiria, Médio Tejo, Oeste e Beira Baixa) que integram a região de turismo do centro “cresceu de 1,6 para 1,9”, aproximando-se das duas noites de estadia média, uma meta há muito estabelecida.
“As pessoas estão a descobrir a hospitalidade portuguesa que é única e com ela uma diversidade de motivos de interesse que existe no Centro”, frisou Pedro Machado, constatando que o mote do TCP – “descubra um país dentro do país” – tem vindo a ser cumprido nos últimos meses por cada vez mais portugueses.
Já na rede de Aldeias de Xisto – que agrega 27 localidades, mais de metade (17) localizada nas serras da Lousã e Açor e as restantes junto às bacias do Zêzere e Tejo/Ocreza – o diretor executivo Rui Simão manifesta cautela quanto a eventuais benefícios da pandemia no turismo da região, argumentando que, apesar de a marca que dirige já ter passado o período de afirmação e possuir clientes fidelizados, “ninguém está bem quando o país está mal”.
A diferença tem-se notado na tipificação da procura que a rede tem observado, este ano, nos meses de verão: “Uma casa com piscina e churrasqueira deixou de estar disponível em junho, julho e agosto. E o alojamento deixou de ser vendido ao quarto para passar a ser vendido à casa inteira”, notou Rui Simão.
Por outro lado, se até aqui predominavam as ‘escapadinhas’ de “duas ou três noites” e muitos casais, agora as Aldeias de Xisto começam a sentir alterações no tipo de reservas, desde logo por serem “mais nacionais e sobretudo famílias a procurarem um espaço amplo”, mas também na duração “que chega às cinco, seis e sete noites”, sustentou o diretor executivo.
A rede das Aldeias de Xisto tem a sua própria plataforma de reservas, que também permite perceber, por exemplo, que quem assume a responsabilidade das reservas pela internet são “sobretudo mulheres entre os 25 e os 45 anos”.
“Dois terços são mulheres para um terço de homens. De alguma maneira são as mulheres que assumem a responsabilidade da família”, frisou Rui Simão.
As reservas e estadias nas Aldeias de Xisto em junho e julho foram, de acordo com Rui Simão, “muito intensas e superaram as expectativas” e agosto, tradicional mês de férias em Portugal, “está a manter o que é normal”.
“Mas setembro, habitualmente, cai a pique e este ano ainda não sabemos como vai ser, até porque haverá reservas mais em cima da hora”, admitiu.
Na rede de Aldeias Históricas de Portugal (AHP), que congrega 12 localidades de dez municípios dos distritos de Coimbra, Guarda e Castelo Branco, mas cujo território se estende a outras dez autarquias, uma das estratégias para captar visitantes passou pela calendarização do evento “12 em Rede – Aldeias em Festa” para os meses de setembro a novembro.
O ciclo de 12 eventos, um dia por aldeia histórica, em espaços devidamente adaptado às atuais regras sanitárias, terá limitação de público, com lugares disponíveis para residentes locais e visitantes.
“Na primeira semana de setembro, os alojamentos no centro de Figueira de Castelo Rodrigo [onde a programação decorre dia 06] já estão esgotados. E na primeira semana de outubro os do Piodão [no concelho de Arganil] também estão cheios”, assinala a diretora executiva das Aldeias Históricas de Portugal (AHP), Dalila Dias.
Para a responsável, a pandemia de covid-19 revelou-se “uma nova oportunidade” para captar novos clientes, concretamente de classe média-alta, “muitos dos quais, habitualmente, nesta altura, viajavam para o estrangeiro e agora ficaram em Portugal”.
A opção pelas aldeias históricas não se esgota no próprio património edificado, estendendo-se às práticas de turismo sustentável a nível económico, social e natural, que lhe valeram, em finais de 2018, ser o primeiro destino nacional (e também o primeiro em rede, a nível mundial) a receber a certificação Biosphere, aprovada pela UNESCO, a organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura.
Em outubro de 2019, a rede AHP foi distinguida com o selo de qualidade da Associação Europeia de Caminhada, que reconhece “como uma das melhores da Europa” a Grande Rota de ligação das 12 aldeias históricas.
O percurso circular de 600 km passa por mais de 100 localidades em 20 municípios e é passível de ser cumprido a pé ou de bicicleta. Oferece aos caminhantes a possibilidade de pernoitarem em alojamentos tradicionais ou no chamado ‘chão duro’, disponível para os mais aventureiros.
Dalila Dias contou que durante o processo de certificação da Grande Rota, os quatro auditores alemães que se deslocaram a Portugal assinalaram “o silêncio, diferente do silêncio alemão” que ali experienciaram.
“Disseram que nós podíamos vender o silêncio”, enfatizou.
Transformar o silêncio em produto turístico foi o que fez o Colmeal Countryside Hotel, um empreendimento de 11 quartos e três casas de campo inserido numa quinta com 700 hectares (o equivalente a mil relvados de futebol), localizado na serra da Marofa, a dez quilómetros de Figueira de Castelo Rodrigo.
Sob o mote “Terra do Silêncio”, o hotel assume não fazer “voto absoluto de silêncio, mas sim de serenidade” e a diretora, Gabriela Fernandes, nota que o isolamento passou a ser uma característica mais apetecível para quem chega, face ao receio da pandemia de covid-19.
“Dizem-nos que aqui se sentem seguros porque [no interior] não há casos [da doença]”, revelou.
Ao longo do verão, as reservas “passaram a ser feitas com mais antecedência” e as estadias “durante mais tempo”, chegando aos seis ou sete dias, quando anteriormente se ficavam pelos três a quatro dias, em média, referiu.
Se o hotel, inaugurado em finais de 2015, recebia habitualmente estrangeiros, maioritariamente franceses, belgas ou espanhóis mas também portugueses “que vinham pela piscina e quando já não havia mais nada vago”, agora o número de turistas nacionais, “que não podem ir para fora ou não vão por medo [da covid-19], tem vindo a aumentar”, frisou Gabriela Fernandes.
Por José Luís Sousa (texto), da agência Lusa
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