A comissão independente criada para averiguar denúncias no Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra confirmou hoje a existência de padrões de conduta de abuso de poder e assédio, por parte de pessoas em posições hierarquicamente superiores.
“Da análise de toda a informação reunida, bem como das versões entre as pessoas denunciantes e pessoas denunciadas que foram compatíveis entre si, indiciam padrões de conduta de abuso de poder e assédio por parte de algumas pessoas que exerciam posições superiores na hierarquia do CES”, revela o relatório final da comissão independente, que iniciou funções em agosto do ano passado.
Durante a conferência de imprensa de apresentação do relatório da Comissão Independente, que decorreu ao final na tarde, o diretor do CES admitiu que o conjunto de denúncias que foram apresentadas podem ter algum tipo de valor penal.
“Tal não compete ao CES avaliar e, nesse sentido, iremos remeter o relatório ao Ministério Público para os fins convenientes”, acrescentou Tiago Santos Pereira.
Três investigadoras que passaram pelo CES da Universidade de Coimbra denunciaram situações de assédio num capítulo do livro intitulado “Má conduta sexual na Academia – Para uma Ética de Cuidado na Universidade”, o que levou a que os investigadores Boaventura Sousa Santos e Bruno Sena Martins acabassem suspensos de todos os cargos que ocupavam no CES.
De acordo com o relatório divulgado, à comissão independente foram denunciadas 14 pessoas, por 32 denunciantes, num total de 78 denúncias.
“As 14 pessoas denunciadas vão muito para além do número de pessoas que tinham sido acusadas publicamente em abril do ano passado”, admitiu o diretor do CES.
78% dos denunciantes são mulheres, 6% homens e em 16% dos casos não foi possível identificar o sexo devido à denúncia ter sido feita de forma anónima.
28% das denúncias dizem respeito a casos de assédio moral, 19% assédio sexual, 8% abuso sexual, 27% abuso de poder e 18% de outras categorias.
“Verificou-se que as versões apresentadas por várias pessoas denunciantes e por várias pessoas denunciadas foram em muitas situações incompatíveis entre si, tornando-se, nessas situações, impraticável aferir evidências das mesmas”, refere ainda.
A comissão independente indica que a documentação apresentada e as audições realizadas, tanto de pessoas denunciantes como de pessoas denunciadas, “não permitiram esclarecer indubitavelmente a existência ou não da ocorrência de todas as situações comunicadas”, embora indiciem padrões de conduta de abuso de poder e assédio por parte de algumas pessoas que exerciam posições superiores na hierarquia do CES.
O relatório alude ainda ao facto de as várias direções do CES, ao longo dos anos, terem subvalorizado algumas situações com indícios de comportamentos menos próprios nas relações entre membros da sua comunidade.
“Com isso, podem ter contribuído para a eventual perpetuação das mesmas. Em concreto, a forma como lidaram com as “Pichagens”, iniciadas em 2017, ignorando e não atuando administrativa e judicialmente, indicia uma maneira leviana de atuação sobre alegados comportamentos que deveriam, por parte de um órgão executivo, ser levados muito a sério, nomeadamente, através de uma investigação interna”, indica.
De acordo com o diretor do CES, a conclusão do relatório é “muito preocupante”, o que levou a que tivessem publicado na sua página de internet uma carta aberta, na qual pediram desculpas às vítimas das práticas de assédio e abuso moral e sexual e de abuso de poder cometidas por investigadores da instituição, estando em avaliação a possibilidade de serem abertos processos disciplinar aos denunciados.
O CES permitiu que duas dezenas de pessoas assistissem à apresentação do relatório, ficando três dezenas no exterior, exibindo algumas folhas onde lia que “a dignidade e segurança das vítimas deve ser priorizada”, “repudiamos todas as formas de assédio” ou “mexeu com uma, mexeu com todas”, frase entoada no final da conferência.
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