Justiça
João Rendeiro: O gestor de fortunas e colecionador de arte que fugiu à justiça
João Rendeiro foi fundador e administrador do Banco Privado Português (BPP), vocacionado para a gestão de fortunas e cujo colapso, em 2010, levou a que fosse investigado e condenado pela prática de diversos crimes económico-financeiros.
O ex-banqueiro morreu na quinta-feira na prisão de Westville, onde foi encontrado enforcado, afirmou hoje a advogada do ex-banqueiro, June Marks.
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Sentenciado a várias penas de prisão por crimes de burla qualificada, fraude fiscal, abuso de confiança, branqueamento de capitais, falsidade informática e falsificação de documentos, Rendeiro esteve foragido à justiça entre setembro e dezembro de 2021, tendo acabado por ser preso em Durban, na África do Sul, em 11 de dezembro do ano passado, em cumprimento de mandado de captura internacional.
Agora encontrado morto na cela da prisão de Westville onde estava detido na África do Sul, o ex-banqueiro enfrentava um processo de extradição para que cumprisse pena de prisão em Portugal e que seria discutido entre nos dias 13 e 30 de junho no tribunal de Verulam.
O colapso do BPP, banco vocacionado para a gestão de fortunas, começou com a crise financeira de 2008 e culminou em 2010, já depois do caso do Banco Português de Negócios (BPN) e antecedendo outros escândalos na banca portuguesa.
Apesar da pequena dimensão do banco, a falência do BPP lesou milhares de clientes e causou perdas de centenas de milhões de euros ao Estado, tendo ainda tido importantes repercussões devido a potenciais efeitos de contágio ao restante sistema quando se vivia uma crise financeira.
Rendeiro e outros ex-administradores do BPP foram acusados de crimes económico-financeiros ocorridos entre 2003 e 2008, na sequência de se terem atribuído prémios e apropriado de dinheiro do banco de forma indevida.
O tribunal deu como provado que os arguidos João Rendeiro, Fezas Vital, Paulo Guichard e Fernando Lima retiraram 31,28 milhões de euros para a sua esfera pessoal, dos quais mais de 28 milhões foram retirados entre 2005 e 2008: João Rendeiro retirou do banco para si próprio 13,61 milhões de euros, Salvador Fezas Vital 7,77 milhões de euros, António Paulo Guichard 7,70 milhões de euros e Fernando Lima 2,19 milhões de euros.
Das três condenações de que Rendeiro foi alvo em três processos distintos, apenas uma já transitou em julgado e não admite mais recursos, tendo o ex-banqueiro sido condenado a cumprir uma pena de prisão efetiva de cinco anos e oito meses.
Em maio de 2021, ex-banqueiro foi ainda condenado a 10 anos de prisão efetiva num segundo processo (pena que foi confirmada pelo Tribunal da Relação a 23 de fevereiro deste ano) e, em 28 de setembro desse ano, a mais três anos e seis meses num terceiro processo, sendo que estas duas sentenças ainda não transitaram em julgado.
Na origem deste último julgamento esteve a queixa do embaixador jubilado Júlio Mascarenhas que, em 2008, investiu 250 mil euros em obrigações do BPP, poucos meses antes de ser público que a instituição liderada por João Rendeiro estava numa situação grave e ter pedido um aval do Estado de 750 milhões de euros.
Na sequência da decisão, João Rendeiro deu conta, através de um artigo publicado no seu blogue Arma Crítica, de que não estava em Portugal e não pretendia regressar, por se sentir injustiçado.
Filho de João Augusto da Silva Rendeiro e de Joana Marques Gonçalves Oliveira, João Manuel Oliveira Rendeiro nasceu em Lisboa e faria 70 anos dentro de alguns dias, em 22 de maio. Era casado com Maria de Jesus Rendeiro.
Apesar de a família ser natural de Aveiro, cresceu em Campo de Ourique, onde o pai abriu uma sapataria, enquanto a mãe geria os imóveis que a família comprava com as poupanças e, depois, arrendava.
O ex-banqueiro estudou nos Salesianos, em Campo de Ourique, e nos liceus Pedro Nunes e D. João de Castro, tendo-se licenciado em Economia pelo Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) e doutorado em Economia pela Universidade de Sussex, no Reino Unido.
João Rendeiro começou a fazer fortuna nos anos 90, quando vendeu ao Banco Totta, por 15 milhões de euros, o fundo de investimento Gestifundo, no qual tinha investido 25 mil euros.
Após cinco anos no Totta, onde ficou a trabalhar, voltou a dar aulas na faculdade, onde terá sido desafiado por um aluno de ‘marketing’ para lançar uma marca de águas gaseificada, à qual chamaram Frize, e que viria a vender à Compal.
O desejo de Rendeiro de criar o seu próprio banco viria a concretizar-se em 1996, quando juntou alguns investidores para comprar a Incofina ao BCP e constituir o Banco Privado Português (BPP), virado para a gestão de fortunas e que contava com acionistas como Francisco Balsemão, Joe Berardo, Stefano Saviotti, a família Vaz Guedes (dona da Somague) e a família Serrenho (dona das tintas CIN).
Com cerca de 3.000 clientes, o BPP funcionou até entrar em rotura em dezembro de 2008, acabando a falência por ser decretada em 2010, devido a erros de gestão e incumprimento das regras do Banco de Portugal e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
João Rendeiro era também conhecido como amante e colecionador de arte, tendo vários dos quadros, esculturas e móveis que detinha, entre outros bens, sido arrestados pela Polícia Judiciária com vista a ressarcir os lesados do BPP.
Em 2008, numa altura em que já começava a estalar o escândalo do BPP, lançou o livro ‘João Rendeiro – Testemunho de Um Banqueiro: A História de Quem Venceu nos Mercados’.
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