Opinião

Felizmente, ela não aprecia Taylor Swift 

Notícias de Coimbra | 4 meses atrás em 27-07-2024

Sou aquele tipo de pessoa que não revela particular apreço pelas recomendações  de gente mais nova do que eu… e, para ser franco, tenho de admitir que este meu  desdém atinge gente jovem, em geral, e, em especial, os adolescentes e jovens  adultos que orbitam no meu microcosmo. 

No fundo – e não tenho qualquer orgulho em confessar esta circunstância – as  opiniões das pessoas que, em razão da sua curta idade, têm uma experiência de  vida diminuta, habitualmente, não me inspiram níveis de confiança e  respeitabilidade que me façam encarar os seus conselhos, sugestões ou  advertências com seriedade. 

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“É novo… sabe lá do que fala”, desdenho eu, silenciosamente, enquanto anuo com  a cabeça em concordância com qualquer palermice ignorante que me chegue de  crianças ou jovens. Não é bonito generalizar – eu sei – e é ainda menos bonito  discriminar os nossos pares. Sinto-me, por isso, obrigado a reconhecer que, aqui  ou ali, de tempos a tempos, já tinha percebido que os petizes acertam mais do que  eu normalmente admito. Ainda assim, acho sempre que acertam muito pouco… 

A maior vítima deste meu preconceito é, claramente, a minha irmã, uma adorável  jovem adulta a quem peço perdão pelo menosprezo de que tem sido alvo ao longo  dos anos. 

E não me desculpo apenas pelo descrédito passado, pois antecipo a possibilidade  de a minha irmã (cuja condição de ‘irmã mais nova’ não pode ser revertida)  continuar a ser vítima da minha resistência ao conhecimento dos mais novos, que  raramente são merecedores da atenção, generosa e recetiva, de quem, como eu,  lhes leva uns bons anos de avanço… avanço na idade e no preconceito. 

Oxalá este preconceito fosse um exclusivo meu. Creio, contudo, que será  partilhado pela grande maioria da população, para quem a idade é um posto e a  juventude é crachá dos imberbes. 

A minha irmã, cansada de não ver a sua voz equiparada aos mais velhos da mesa,  há muito vai protestando – de forma bastante insistente e ruidosa, aliás, mas, ainda  assim, incapaz de captar as atenções dos ‘idosos’ do Restelo que integram a  família. 

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Tivesse ela o meu conhecimento sobre a discografia do cachopo Samuel e ter-me ia já recordado que, no fim do dia, a “juventude é mentalidade”. Tivesse ela clamado  “Eu sou jovem como novo com fome e com ideias/ Novidade como estreias  aplaudidas por plateias” e eu ter-me-ia retratado mais cedo, com certeza.

[E cá estou eu, mais uma vez, a impor-lhe as minhas referências, numa prova de  que o preconceito é ainda mais relutante do que eu.] 

De qualquer forma, o tempo – bom conselheiro – veio confirmar que os preconceitos  lesam bem mais quem os carrega do que quem deles é alvo. Afinal de contas, a  miúda equilibra o desconhecimento da obra do poeta de Chelas com propostas  sobre as quais eu pouco ou nada sei, como é o caso dos Måneskin, grupo composto  por quatro talentosos italianos que, há um par de anos, ganharam a Eurovisão. 

Assim – semana sim, semana não- a minha irmã foi tentando esbater a minha  resistência à novidade, com o propósito final de me apresentar os hits da banda que  – pasme-se -foi batizada por Mick Jagger como a maior banda de rock da atualidade. Fui sendo gradualmente doutrinado, pela sua perseverança e crença de que os  méritos deste coletivo musical eram dignos do meu foco e, na semana passada, a  evangelização foi concluída, com sucesso, no palco principal do Super Bock Super  Rock. 

Então não é que os gajos são mesmos bons!? No Meco, comprometidos em fazer  notar a sua estreia em palcos portugueses, mostraram ter o rock a correr-lhes nas  veias – e, provavelmente, mais meia dúzia de substâncias ilícitas.  

Sem que o previsse (já que a minha ida ao festival tinha sido quase exclusivamente  motivada pela vontade de testemunhar a felicidade da caçula), fui surpreendido por  aqueles modernos romanos, cuja discografia mal conhecia. 

No final, foi impossível não agradecer à minha irmã, não só por me apresentar  grandes músicas como “MammaMia”, “Baby said”, “Bla Bla Bla” ou “Zitti & Buoni”,  mas, sobretudo, por cultivar preferências culturais que não me obrigam a  acompanhá-la a espetáculos da (também) jovem Swift, musa dos seus  contemporâneos gen-Z. “Felizmente, ela não aprecia a Taylor”, constato, vaidoso  pelo seu apurado palato musical, que desmente o velho provérbio popular. 

Em matéria cultural, pelo menos, a idade não é um posto. Por uma daquelas  famosas ironias do destino, horas depois do concerto, foi a política americana a  atestá-lo: de facto, a idade não é um posto, e nem tão pouco segura o posto. 

Afinal, ao contrário do que propagam os mais conservadores – eu, incluído – a idade  tem vários inconvenientes e, por vezes, no lugar da sapiência dos mais velhos  (idosos, seniores ou seres humanos de longevidade assinalável – deixo à vossa  escolha o termo entre a oferta do léxico woke), a jovialidade de quem, em razão da  idade, tem mais interesse em olhar o novo e pensar o futuro pode ser o remédio  para os nossos pecados e preconceitos, mais do que velhos, caducos.

OPINIÃO | BERNARDO NETO PARRA

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