Discotecas

Espaços de diversão noturna da região de Coimbra “à beira do abismo”

Notícias de Coimbra | 4 anos atrás em 15-05-2021

As discotecas e bares com pista de dança foram um dos negócios mais afetados pela pandemia Covid-19. À semelhança da restauração e hotelaria, que ainda assim  que nos últimos tempos foram tendo períodos de funcionamento, o mesmo já não se pode dizer de discotecas e do “universo da diversão noturna”, que viram a sua atividade encerrada indefinidamente desde março de 2020 quando o vírus Sars-Cov-2 tomou conta do mundo. 

O mês de Abril foi fulcral no processo de “desconfinamento a conta-gotas” anunciado pelo Governo já que com ele regressaram as esplanadas, os restaurantes, cafés e também pastelarias. Já as discotecas e outros espaços de diversão noturna continuam sem vislumbrar nenhuma luz ao fundo do túnel. 

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Os estabelecimentos de diversão noturna na região de Coimbra não foram exceção à regra e viram-se obrigados a fechar portas em março do ano passado.

O Notícias de Coimbra contactou diversas “casas da movida local” e também alguns DJ’s, e no decorrer das entrevistas, as palavras mais proferidas quer por proprietários e gerentes de discotecas quer por disco-jockeys foram “saudade”, “tristeza” e “responsabilidade”. 

O NB Club Coimbra encerrou logo no início de março e foi uma das primeiras casas a fechar em Portugal, “fechámos antes mesmo da obrigatoriedade imposta pelo Governo e não foi apenas a casa de Coimbra a encerrar nesta altura, foram todas as discotecas do grupo”, disse o gerente Roger Sousa. 

A discoteca Padaria, situada na Lousã, fechou portas no dia 2 ou 3 de março do ano passado, antes ainda de o Governo ter decretado o encerramento das discotecas e bares. O responsável, Paulo Mendonça, concorda com a decisão do governo, mas critica a atribuição dos apoios “Tivemos apoios, mas chegaram muito tarde, tive seis meses sem receber nenhum apoio e continuei a ter que pagar a Segurança Social e a renda todos os meses, mesmo estando fechado”. 

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Quanto aos apoios financeiros, Roger Sousa refere que os apoios a que o NB teve acesso “foram aqueles que toda a gente na área teve”, referindo-se ao programa APOIAR e ao afamado “lay-off”. 

Bruno Cardoso, gerente do Tweet, compreendeu a decisão do Governo de proibir o funcionamento dos bares e discotecas por serem “um grande foco”.  

Mandarim

Ricardo Jorge, responsável pelo  “Mandarim” refere que no primeiro ano em que rebentou a pandemia estiveram encerrados oito meses e em 2021 três meses e que tiveram acesso ao lay-off por parte do Governo. 

O funcionário do Mandarim acrescentou ainda que o apoio do município foi importante para manter o negócio “de pé: “Quando houve possibilidade de trabalhar durante o dia, usufruímos de uma esplanada que a Câmara Municipal de Coimbra forneceu a todos os comerciantes da Praça da República e aí sim optamos por trabalhar, foi muito bom tudo o que a Câmara nos deu para trabalhar, porque nos permitiu faturar alguma coisa para manter os nossos empregados e negócio”.

Quanto às restrições impostas pelo Governo, João Gouveia, responsável pelo bar Aqui Base Tango fala de um “falso moralismo por parte do Governo” no que toca à limitação de horários e venda de álcool que no último ano foram vigorando, lembra que “essa intenção de impedir excessos esquece o problema das festas ilegais que acontecem sem nenhum controlo, enquanto nos estabelecimentos esse controlo era feito. É urgente a reabertura das discotecas e bares, com lotação controlada e todos os cuidados possíveis, porque o encerramento destes estabelecimentos potencia festas ilegais”. 

Relativamente a apoios, o Tweet, viu a sua situação muito dificultada pela pandemia, já que tal como explicou o gerente Bruno Cardoso, a discoteca só abriu em 2020 com a sua gerência e por isso sem descontos passados ficou com todos os encargos às costas “Não tive qualquer apoio por parte do Governo, tive que dispensar toda a gente, que não tive apoio absolutamente nenhum”. 

Trocar as luzes psicadélicas e o som estridente por “música chill out”, meias de leite e pastéis? 

Alguns bares e discotecas, durante o verão passado, tiveram que se adaptar conforme ia sendo alterado o enquadramento legal da DGS durante a pandemia, e viram a pista de dança a ser ocupada por mesas e o bar que antes se caracterizava pelo brilho das garrafas de álcool e as luzes estroboscópicas pela venda de café, salgados ou doces.  

Quanto à alteração do modelo de negócio de alguns estabelecimentos noturnos, Roger Sousa, afirma que no caso do NB não faria sentido “Há pessoas em Coimbra que se adaptam consoante o vento, podem ser talho, café, padaria… Nós não, nós somos uma discoteca e é nesse sentido que queremos trabalhar. O gerente do NB avisou ainda que “há muitos espaços a trabalhar em Coimbra como discoteca sem licença para tal”. 

Também Bruno Cardoso, do Tweet, concorda com esta posição e defende que “cada ramo é um ramo”, posicionando-se, por isso, contra a adaptação de estabelecimentos de diversão noturna no contexto da pandemia.  

Já o “Aqui Base Tango”, seguiu por outra via e procedeu à alteração do conceito do negócio como explicou João Gouveia, “acrescentámos o alvará de cafetaria para podermos trabalhar a partir de 18 de maio de 2020”. 

“Quem não tem cão caça com gato”: Pandemia – necessidade e reinvenção 

Alguns bares e discotecas, de portas encerradas, viram nas redes sociais uma alternativa segura para continuar a levar música e diversão às pessoas. Foi o caso do NB, que apostou numa programação online quer no carnaval 2021, quer na celebração do aniversário do NB. O Tweet pensou seguir o mesmo caminho, mas segundo o gerente quando viram a concorrência a abandonar gradualmente essa ideia “decidiram também não seguir esse rumo” 

Nem só de luz e bebidas vive o “mundo da noite”, e a crise pandémica veio afetar radicalmente a vida de quem trazia a alegria da música a tantas pessoas: os dj’s. 

Filipe Sanches

O disco-jockey, conhecido de todas as pistas de dança conimbricenses, Filipe Sanches, viu a sua vida “virada de cabeça para baixo” e encontrou na profissão de motorista da Uber uma forma alternativa de conseguir algum rendimento – “Não tive qualquer tipo de apoio, por isso é que tive que me fazer à estrada. Tive que me dedicar a outro trabalho, porque infelizmente a música com isto tudo não dava para as pagar contas, já antes era difícil, mas com isto tudo é para esquecer”. 

Apesar do cenário negro que o setor vive atualmente o disco-jockey mantém-se positivo e acredita no regresso às pistas de dança e às mesas de mistura já este Verão, com sunsets e dj-sets ao ar livre. Quando aos espaços fechados, acredita na reabertura talvez em Setembro ou Outubro. 

Quando confrontado com a questão: “A noite depois da Covid-19 vai ser muito diferente?” Filipe Sanches mantém-se otimista e acredita que a noite vai voltar ao que era, aliás, que será melhor que nunca “Acho até que vai ser o fim do mundo, como aconteceu com as esplanadas e vai ser ótimo para nós que vivemos do contacto com o público, vamos matar as saudades todas.”  

Romeu Ferreira, outro dj que já passou música em muitas das discotecas da região de Coimbra sob o nome artístico “’R’GROUND” diz que o encerramento das discotecas foi difícil, principalmente por gostar de passar som, mas que podia ter sido pior, porque Romeu já desempenhava a função de barbeiro na Lousã, pelo que não estava totalmente dependente, a nível económico, de passar música em estabelecimentos noturnos. 

Romeu acrescentou que viu neste período de “cultura e arte confinada” uma oportunidade para aprimorar a sua arte, e aprofundou o interesse pela sonoridade mais pura e orgânica dos vinis “Durante a pandemia como tive mais tempo para pensar e explorar mais, entrei um bocado na onda antiga, comecei a passar som em vinil e a minha ideia até era agora quando isto voltasse ao normal é tocar só em vinil”. 

Impacto do encerramento das discotecas na saúde mental 

Se é verdade que em “canta seus males espanta”, o mesmo se verifica com a dança que funciona, muitas vezes, como uma atividade libertadora e que reduz o stress. 

Com as pessoas fechadas em casa e a “vida lá fora confinada” durante quase um ano, também a saúde mental da população em geral se deteriorou, como aliás, têm concluído diversos estudos científicos.  

Aqui Base Tango

Também as pessoas contactadas pelo NDC, gerentes e responsáveis por estabelecimentos noturnos na região de Coimbra, atestam esta perspetiva. João Gouveia, do Aqui Base Tango, diz que o confinamento e os receios trazidos pela doença Covid-19 vieram contribuir muito para a degradação da saúde mental das pessoas “Nós notámos que tivemos mais problemas de segurança o Verão passado do que nos últimos dois anos, e é lógico que isto é indicativo de alguma coisa. O confinamento fez mal a muita gente e as discotecas e bares acabavam por funcionar muitas vezes como psiquiatras de muita gente”. 

Paulo Mendonça, proprietário da discoteca “A Padaria”, na Lousã, adianta que todos os dias é contactado por pessoas a pedir a reabertura do espaço. “As pessoas precisam de dançar, de conviver, de falar, de toque e dessa convivência”. 

Associação Nacional de Discotecas tem vindo a pedir a abertura gradual dos espaços de diversão nocturna, começando pelos que têm áreas ao ar livre.

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