Opinião

Escada de ganchos

Opinião | Amadeu Araújo | Amadeu Araújo | 3 semanas atrás em 07-12-2024

Foi um fogo, dos valentes. E antes, já tínhamos tido outro, também numa fábrica.

As coisas são que são e atrás das agulhetas, vieram os tanques de grande capacidade.

As bocas de incêndio gaguejaram e até houve um especialista em fogos industriais que me apareceu, televisões adentro, a explicar o desastre, no exato dia em que os capacetes e casacos estavam em Lisboa.

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Não sei como é que equipamento de combate a fogos de Coimbra, pago com dinheiro público, estatal e municipal, aparece em Lisboa. O especialista o dirá, fico-me nas bocas de incêndio em que o valor mínimo de caudal mais desfavorável a considerar é de 3 litros por segundo, e isto com metade delas em funcionamento.

Mas, pronto, estamos habituados a sacudir a água dos hidrantes e eu lembrei-me do Alcino, um rigoroso bombeiro sapador, quando o quartel ainda era na Praça da República.

O Alcino, além de bombeiro era artesão. Talvez, à época, o único que na Região Centro sabia cuidar das escadas de croché, que são conhecidas por ganchos que se enfiam no parapeito, que deve ter entre 30 e 40 centímetros.

O Alcino reparava a fita de tecido, degraus, banzos e madeira e ali tínhamos uma ferramenta pronta a escalar e a garantir acessos. E era um bombeiro que sabia o que fazia e do que falava.

Contudo, nestes dias ácidos, é norma falar-se do que não se sabe, para explicar a inação. E a ignorância é atrevida.

Vejam aquele miúdo que no centenário de Mário Soares, de quem minha mãe que pariu filho apartidário chegou a ser mandatária, foi na desfeita. A vulgar desfeita, ou meia de bacalhau. Uma punheta, como diz o bom povo. E lá veio o desodorizante na descolonização “apressada”, esse “injusto” rótulo de retornados e a vida a reconstruir do zero.

Um país que se portou de forma exemplar e soube erguer prédios e acolher quase um milhão de pessoas. Mas enfim, estamos num país em que até a Força Aérea apagou o vídeo de um ministro em fúria.

Melhor sem provas, que o país não gosta da tropa, nem entende a sua necessidade.

Melhor ir pelo Chega, como faz Santana Lopes, convidado a participar em debate nas jornadas parlamentares do partido, em Coimbra e Leiria.

Entretanto, temos menos 20 mil pobres. Foi isto que conseguimos num ano.

Temos 1,76 milhões, 16,6% da população, a viver com menos de 738 euros.

E isto preocupa-nos? Não. O que nos preocupa são as escadas de ganchos que já serviram a dois bastonários para encavalitarem a política e agora servem aos miúdos que com arruaça vão dizendo que o país não precisa de um militar na Presidência da República.

Para começo de conversa, nem precisamos de Presidente da República. O da Assembleia da República faz bem esse papel.

Estarolas, pensamos que somos ricos, desprezamos o que temos, e não cuidamos de todos.

Preferimos atirar atordoadas, é muita carga na boa de incêndio e pronto. Meter ordem na casa, arrumar a administração pública e ordenar o território são exigências que os políticos de turno não querem saber. E assim estamos onde estamos.

Todos bem cientes que vale tudo, desde que o intuito seja levar os nossos às sinecuras.

Sorte a deles. Mal gasto, mas a água do PRR ainda apaga incêndios. Quando ela acabar, logo veremos a receita.

Só lamento os calculismos táticos que enxameiam a solidariedade, que se faz com ética republicana.

OPINIÃO | AMADEU ARAÚJO – JORNALISTA

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