As mulheres continuam a ganhar menos que os homens, porque estão maioritariamente em profissões, funções e categorias com piores salários, o que pode e deve ser contrariado, segundo a CGTP, com negociação, no âmbito da contratação coletiva.
Fátima Messias, que coordena a Comissão para a Igualdade entre Mulheres e Homens, da CGTP, disse à agência Lusa que a contratação coletiva é fundamental para eliminar a discriminação no mundo laboral, embora haja muito trabalho prévio a fazer.
“Tem que se ter um trabalho de identificação para ver onde estão as discriminações, quais as suas causas e utilizar um instrumento fundamental, que é a contratação coletiva, ou seja, através da revisão das tabelas, das categorias profissionais é possível ir eliminando e acabar mesmo com a discriminação que existe no nosso país”, disse a sindicalista.
Mas para concretizar esse objetivo seria necessário contar com o interesse das empresas, o que nem sempre acontece.
“É preciso haver negociação, é preciso haver acordo entre as partes e o patronato está mais empenhado em fazer chantagem com a caducidade e introduzir bancos de horas, adaptabilidades e desregulação gradual dos horários, do que ter uma visão de progresso da evolução profissional”, considerou Fátima Messias, que integra a comissão executiva da Intersindical.
A CGTP promove ao longo da próxima semana a 9.ª edição da Semana da Igualdade, em todo o país, sob o lema ‘A Igualdade tem de existir| Para o país evoluir’, com o objetivo de denunciar as discriminações existentes.
“Nesta semana de 07 a 11 de março vamos estar em vários locais de trabalho, temos já um levantamento de 1.000 locais de trabalho de todo o país”, salientou Fátima Messias.
Nos locais de trabalho vão decorrer reuniões de trabalhadores, plenários, algumas greves, a par de iniciativas como debates e exposições relacionadas com os temas da semana da igualdade.
“Vamos ter também tribunas públicas, manifestações e concentrações em torno daqueles temas que neste momento são mais sentidos pelas mulheres trabalhadoras”, disse a sindicalista.
O objetivo da semana da igualdade “é trazer para a discussão pública as discriminações salariais, a dificuldade de conciliação do trabalho com a vida familiar, o assédio, as doenças profissionais, as penalizações pelo exercício dos direitos de maternidade e paternidade, muito sentidas pelas jovens trabalhadoras”.
“O grande objetivo é, em torno do Dia Internacional da Mulher, dar uma dimensão acrescida aos problemas da igualdade no mundo do trabalho, ou seja, nós temos legislação, contratação coletiva e a Constituição da República que asseguram a igualdade entre homens e mulheres, mas na vida e no trabalho em particular ela não está consolidada e esta semana condensa um conjunto de iniciativas que trazem essa temática para a luz do dia”, afirmou Fátima Messias.
A sindicalista identificou à Lusa as principais causas da discriminação salarial que afeta as mulheres, mantendo-as a ganhar menos, apesar de trabalharem mais horas.
Salientou as “discriminações diretas e indiretas que persistem nos locais de trabalho pelo facto de as mulheres ainda estarem muito localizadas em setores económicos de baixos salários, como, por exemplo, se verificou nesta fase da pandemia, no setor social e da saúde”, onde mais de 87% são mulheres, como as enfermeiras, ou no setor do comércio e serviços, onde as mulheres têm aumentado de forma expressiva.
“São profissões geralmente mal pagas, são profissões e categorias profissionais a que correspondem os mais baixos salários. E também a maioria dos trabalhadores que no nosso país ganham salário mínimo nacional (SMN) são mulheres”, referiu Fátima Messias.
De acordo com Fátima Messias, são os níveis mais baixos de determinadas profissões que concentram a maioria das trabalhadoras.
“Em funções mal pagas, em funções de auxiliares, de assistentes, em funções de entrada na profissão, mas que são de tal forma genéricas e concentram tal número de mulheres, que acabam por concentrar nos níveis salariais mais baixos e categorias profissionais mais baixas o maior número de mulheres em determinados setores e empresas”, salientou.
A dirigente da Inter lembrou que maioria dos trabalhadores com vínculos precários também são mulheres.
“Os vínculos, as profissões, os setores onde estão localizadas, tudo isso tem contribuído para salários mais baixos, comparativamente aos salários dos homens, companheiros de trabalho”, disse.
Segundo a sindicalista, isto contribui para haver uma média de salários mais baixos por parte das mulheres trabalhadoras , que depois tem efeitos nas reformas, que são mais baixas, originando pobreza ao longo da vida.
A sindicalista reconheceu, no entanto, que nos últimos anos se verificou alguma redução da diferença salarial entre homens e mulheres devido ao aumento do SMN, “embora insuficiente”.
Fátima Messias lembrou que tem também havido evolução nalguns setores da indústria, através da contratação coletiva, e estão a ser desenvolvidos estudos sobre o assunto no setor do calcado.
“Tivemos um projeto, na CGTP, há uns anos, para revalorizar o trabalho, em que foi feita uma avaliação de funções na hotelaria e restauração que também deu alguns resultados. Temos também [resultados] no setor da cortiça e no setor vidreiro e outros, mas tem de se avançar mais”, disse.
Para a dirigente sindical, os progressos não são maiores porque as empresas não se empenham no trabalho que é necessário fazer para acabar com a discriminação salarial entre homens e mulheres e a legislação não as pressiona.
“Não temos tido mais resultados por um motivo que é externo à própria discriminação, que é um problema maior ainda, que é o facto de a contratação coletiva ter estado paralisada, bloqueada nos últimos anos pelas entidades patronais. E aí temos um problema também para resolver, pois enquanto tivermos esta legislação do trabalho, que consagra a caducidade das convenções e o fim do tratamento mais favorável, que existia anteriormente, então o caminho para eliminar a discriminação está dificultado. Encontramos na legislação um obstáculo para ultrapassar o problema da discriminação salarial”, considerou.
Nos dois anos pandemia “não houve um agravamento estatístico das discriminações” mas “não houve a valorização salarial que é necessária para acabar com aquilo que ainda é uma diferença muito grande”.
“No salário base são cerca de 14%, mas quando englobamos os salários com as outras retribuições, os prémios variáveis, etc, chega a ser na ordem dos 18, 19, 20%”, disse Fátima Messias.