Economia
Confederação Nacional da Agricultura acusa Governo e celuloses de quererem produzir pau em vez de pão
A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) acusou hoje o Governo de agir segundo os interesses da indústria de pasta de papel, ao querer intervir nas terras abandonadas ou alegadamente sem dono, “para produzir pau” em detrimento de bens alimentares.
O Governo, através do gabinete da ministra da Agricultura e do Mar, Assunção Cristas, reagiu às acusações, garantindo “total respeito pela propriedade privada”.
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“Querem arregimentar grandes áreas para a produção de pau, mas não para produzir pão”, criticou João Dinis, da CNA, em declarações à agência Lusa.
Na sua opinião, “os responsáveis do Ministério da Agricultura portam-se como meros executivos das celuloses e dos aglomerados”, que ambicionam “aumentar em Portugal a produção de varas de eucalipto ou de pinho”.
O Estado vai intervir nas “propriedades aparentemente sem dono e visivelmente abandonadas” para as “colocar sob melhor gestão”, anunciou na quarta-feira, em Coimbra, o secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural, Francisco Gomes da Silva.
O dirigente da CNA recordou que o crescente abandono da propriedade rural nos últimos anos resultou da Política Agrícola Comum (PAC) e das próprias políticas nacionais.
João Dinis disse ainda que, com o atual Governo, “a grande parte dos apoios públicos” do setor agroflorestal “estão destinados às celuloses”, além dos “benefícios fiscais” que lhes são atribuídos.
O responsável da CNA alegou que a indústria das celuloses e dos aglomerados “também quer abocanhar os baldios e já está a abocanhar o regadio do Alqueva”, em detrimento da produção de alimentos.
“Os grandes interesses económicos querem tomar conta das nossas terras a troco de dez réis de mel coado”, corroborou, por seu turno, Luís Trota, presidente do Conselho Diretivo dos Baldios de Vilarinho, no concelho da Lousã.
Há dois anos, o Tribunal da Lousã condenou o Estado a “entregar imediatamente” à Assembleia de Compartes os baldios locais, que estavam em regime de cogestão com o Estado.
“Há aqui gato escondido com rabo de fora”, afirmou Luís Trota.
Os cerca de 900 hectares de floresta comunitária de Vilarinho, na Serra da Lousã, hoje administrados em exclusivo pelos compartes, estavam “completamente abandonados”, lamentou.
“O Estado deixou-nos a serra infestada de acácias. Desconfiamos que agora a queira deixar infestada de eucaliptos, pois as celuloses é que estão a mandar no Governo”, acrescentou.
Idêntica posição assumiu Joaquim Seco, tesoureiro dos Baldios de Vilarinho.
Enquanto os baldios estiveram no regime de cogestão com o Estado, “havia pouca limpeza e pouco arranjo de caminhos” florestais, enfatizou o ex-presidente da Junta de Freguesia, agora agregada à da Lousã.
O Gabinete de Comunicação e Imprensa do Ministério da Agricultura e do Mar (MAM) negou hoje ser objetivo do Estado “assumir a gestão direta de tais terras” e que “apenas o fará durante o período mínimo necessário para que estas possam ser ‘transacionadas’ na bolsa de terras”.
As afirmações do secretário de Estado Francisco Gomes da Silva “traduzem aquilo que por diversas vezes tem já sido afirmado”, segundo uma nota do MAM enviada à Lusa.
“A Lei da Bolsa de Terras (Lei nº 62/2012, de 10 de Dezembro) estabelece, no nº 1 do seu artigo 9º, que são disponibilizados na bolsa de terras os prédios reconhecidos, nos termos do presente artigo, como prédios sem dono conhecido e que não estejam a ser utilizados para fins agrícolas, florestais ou silvopastoris”, acrescenta.
O MAM esclarece que aquele governante afirmou ainda, em Coimbra, que “está pronta a entrar em circulação a proposta de lei que dá sequência ao estabelecido” nos números 1 e 2 do referido artigo nono.
“As terras que venham a ser reconhecidas como ‘sem dono conhecido e que não estejam a ser utilizados para fins agrícolas, florestais ou silvopastoris’ serão disponibilizadas na bolsa de terras”, adianta.
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