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Cavalos limpam terrenos à volta de aldeia.“Ó Trovão! Trovão! Vem cá!”
Imagem: Depositphotos
Em Alge, no concelho de Figueiró dos Vinhos, os cavalos são a solução para a limpeza dos terrenos à volta da aldeia. Ao início, era um casal, mas hoje já são cinco garranos num projeto que quer crescer.
Na entrada da aldeia, os cavalos espreitam por trás de uma cerca, junto à garagem da sede da Comissão de Compartes dos Baldios de Alge, situada no interior do distrito de Leiria. Passado pouco tempo, fogem depois de Joaquim Brás, da comissão, os enxotar – ainda noutro dia tinham andado pela garagem.
Os animais deixam de se ver, mas Joaquim assegura que será fácil encontrá-los. Depois de uma caminhada de umas centenas de metros em alcatrão, lá se avistam os cinco.
“Olhe-os ali, em cima”, aponta Joaquim para os quatro cavalos adultos e um potro com meses de vida, num terreno onde a erva está rente – tudo fruto do seu trabalho.
Apesar das cercas, há zonas abertas, permitindo aos cavalos a volta pela aldeia. Os animais têm também passagem livre para os montes que circundam Alge, mas acabam sempre por voltar.
“Andam por todo o lado, mas habituaram-se a isto e não saem daqui. O que eles querem é festas e comer”, conta à agência Lusa Joaquim, que trata de chamar o Trovão, o macho do grupo, e um dos dois primeiros cavalos que chegou ali à aldeia em 2021 – outros três já nasceram por Alge.
“Ó Trovão! Trovão! Vem cá!”, chama Joaquim. O garrano e duas éguas, suas filhas, já adultas, vao ter com ele, como se fossem cães a responder ao dono.
Joaquim dá-lhe festas e logo comenta: “O Trovão é o mais mansarrão de todos”.
Segundo este membro da comissão de compartes, os cavalos “não dão trabalho” e a convivência com os residentes é “pacífica”. Aliás, quase todos sabem os seus nomes: Trovão, Épona, Luna e Estrela (a mais nova ainda não tem nome).
Joaquim olha para as terras por onde os garranos andam e recorda que aqueles cerca de 30 hectares eram terras de cultivo “há 30 ou 40 anos”, mas que antes de os cavalos chegarem estavam abandonadas e cheias de silvas.
O irmão de Joaquim, Bruno Brás, presidente da Comissão de Compartes dos Baldios de Alge, diz que avançaram, numa fase experimental, com sete cabras para assegurar a limpeza dos terrenos em volta das aldeias, mas não funcionou.
“Destroem os castanheiros, dão demasiado trabalho e é preciso ter uma pessoa de forma permanente a andar atrás das cabras e isso era impossível”, recorda Bruno, advogado de 40 anos, referindo que, na altura, acabaram por vender as cabras e comprar um casal de garranos e dois burros após sugestão de um colaborador da comissão para tentar encontrar uma solução para a limpeza dos terrenos, que através de meios mecânicos ficava cara e sem grandes resultados.
Os últimos três anos têm sido um processo de aprendizagem, mas os custos que deixaram de ter na limpeza fazem com que Bruno acredite que estão no caminho certo.
“Não há bela sem senão. Os veados rebentaram-nos a cerca, os cavalos chegaram a ir para a estrada nacional e algumas pessoas que não são residentes não acharam muita piada aos cavalos na aldeia”, conta.
Além disso, um dos burros passou a visitar as “capelinhas todas” da aldeia a pedir comida e, a determinado momento, habituado a outras comidas, deixou de querer comer erva, recorda Bruno Brás.
Mas o resultado, apesar de alguns problemas, está à vista: terrenos limpos, num projeto com animais que obrigam a pouca manutenção.
O projeto trouxe também visitantes a Alge, que se deslocam à pequena aldeia com cerca de 20 habitantes para matar a curiosidade e ver garranos à solta, onde não seria normal encontrá-los.
No entanto, os cavalos são apenas um ponto de partida para uma aldeia que quer crescer, dinamizar a economia local e tornar-se, ao mesmo tempo, mais resiliente contra os incêndios.
O presidente da Comissão de Compartes dos Baldios elenca vários projetos: ação de reflorestação com plantação de folhosas, produção de resina, produção de mel e introdução de vacas barrosãs e cavalos em 120 hectares na zona da serra, em altitude.
Os próprios cavalos que agora limpam os terrenos à volta da aldeia são também o primeiro passo para uma futura quinta pedagógica na aldeia, avançou Bruno Brás.
“O interior é sempre visto como o parente pobre e condenado ao despovoamento. Nós entendemos precisamente o contrário, que há um conjunto de oportunidades que não estão claramente exploradas”, apontou.
A própria aldeia tem sofrido um processo de transformação, que Bruno Brás espera que se possa acentuar.
Em 2005, não havia residentes permanentes em Alge e, hoje, “já são cerca de 20”, referiu, entre pessoas que voltaram à terra natal para a passar a reforma e habitantes em idade ativa.
Com os projetos que tem em mãos, a comissão de compartes, que gere cerca de 2.500 hectares, espera contribuir para “duplicar o número de habitantes”.
“Os cavalos são o princípio de muita coisa”, afiançou.
Armindo Henriques, de 65 anos, voltou à terra onde nasceu há dois anos, já com os cavalos instalados.
“É uma maravilha, foi a melhor coisa que veio para aqui. Está tudo limpinho”, comenta, na casa de convívio da aldeia, onde ainda há dias os cavalos estiveram “ao balcão e só não entraram porque a gente não deixou”.
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