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Caso BPP: Clientes assumem investimento de risco mas insistem que foram enganados
Os três clientes da Privado Financeiras que hoje testemunharam em tribunal afirmaram que estavam cientes do risco de perda total do capital aplicado neste veículo, mas garantiram que foram enganados quanto à operação de aumento de capital da Privado Financeiras.
Depois de Acácio Silva ter dito esta manhã que foi “enganado três vezes no mesmo dia” quando aceitou participar no aumento de capital da Privado Financeiras com o intuito de aumentar a participação do veículo no capital do Banco Comercial Português (BCP) e diminuir o preço médio por ação em carteira, sem imaginar que parte da verba captada foi usada para abater créditos da própria Privado Financeiras junto da banca, os dois outros clientes (que se constituíram como assistentes neste processo) que hoje testemunharam alinharam pelo mesmo diapasão.
Amândio Silva assumiu perante o coletivo de juízes que celebrou um empréstimo de 150 mil euros com o Banco Privado Português (BPP) para participar na operação de aumento de capital do BCP em 2008.
“O que eu não sabia é que o dinheiro que era pedido para investir no aumento de capital do BCP estava a ser usado para pagar a alavancagem do veículo”, alegou o cliente, que, além de ter perdido os 150 mil euros mencionados, ficou também sem os 150 mil euros do investimento inicial na Privado Financeiras.
“No meu espírito, se não fosse possível adquirir as ações [sobrantes] do BCP [no aumento de capital], devolveriam o nosso investimento. Dos 150 mil euros que investi [nesta operação], sou responsável pelos títulos que o banco comprou. Agora, pela parte que o banco destinou a outros fins, não sou responsável”, afirmou.
E reforçou: “Isso foi feito nas minhas costas. Eu não admito que o meu dinheiro tenha sido usado de uma maneira totalmente distinta àquela que me foi proposta”.
Num depoimento emotivo, no qual reconheceu ser normal o recurso à alavancagem neste tipo de veículos de investimento, por várias vezes o juiz presidente, Nuno Salpico, alertou Amândio Silva para evitar o tom “emotivo” que utilizou na resposta às várias questões que lhe foram sendo colocadas.
Por seu turno, António Gandra, também cliente da Privado Financeiras e assistente neste processo, confessou ao coletivo de juízes que se sente “enganado” com o investimento de 150 mil euros que fez na operação de aumento de capital da Privado Financeiras que deveria ser usada para o veículo aumentar a sua posição no BCP.
“Claro que me sinto enganado. Eu diria que é mais do que isso. Quando venho a saber mais tarde que a Privado Financeiras tinha um negativo de 50 milhões de euros ou muito mais e que parte do dinheiro que entreguei ao banco foi para tapar esse buraco e o resto para fazer esse investimento, acho que é desonesto. É deselegante”, disse.
“É a mesma coisa que estarem a tentar fazer de mim uma pessoa anormal”, realçou Gandra, que é presidente da Bicafé, empresa com sede no Porto.
“Se eu fizesse ideia de que a Privado Financeiras tinha aquele buraco, ia lá por mais 150 mil euros? É óbvio que não”, argumentou.
E salientou: “Eu e fosse quem fosse não ia lá meter o dinheiro. Sinto-me revoltado. Não metia lá um tostão”.
Admitindo saber que se tratava de um investimento de risco, Gandra destacou que “é normal ganhar e perder”, mas que “não é normal ser enganado”.
O responsável revelou que o investimento inicial que fez na Privado Financeiras, no montante de 150 mil euros, chegou a valer, no final de 2007, cerca de 200 mil euros. Porém, a partir daí a cotação das ações do BCP caiu a pique.
A pouca informação dada pelo veículo de investimento do universo BPP também foi criticada pelos antigos clientes, que disseram que não se esforçavam por obter mais informações acerca da situação do mesmo por confiarem nos seus gestores de conta.
Na quinta-feira serão retomados os trabalhos, pelas 09:30, nas Varas Criminais de Lisboa, com a audição dos depoimentos de outros antigos clientes.
No julgamento do caso Privado Financeiras, que arrancou na semana passada, os investidores deste veículo, entre os quais se destacam Francisco Pinto Balsemão, Stefano Saviotti e Joaquim Coimbra, alegam que foram lesados em mais de 40 milhões de euros.
Os arguidos, João Rendeiro, Paulo Guichard e Salvador Fezas Vital, são acusados pelo Ministério Público de burla qualificada em coautoria.
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