Opinião
Carta de amor aos 5ª Punkada
Devo começar este texto por duas advertências. A primeira é que, por motivos profissionais, mantenho há vários anos com os membros dos 5ª Punkada uma relação próxima, vindo acompanhada do pedido de que desconsiderem esse facto. A segunda é que, apesar de provavelmente já saberem que o grupo foi formado na Associação de Paralisia Cerebral de Coimbra e dele fazerem parte pessoas com deficiência, este texto nada tem a ver com isso.
Porque quem vos escreve é, apenas e só, um grande fã dos 5ª Punkada. Alguém que, ainda hoje, depois de inúmeros concertos e ensaios em que teve a sorte de poder estar presente, tem enorme dificuldade em colocar em palavras a espécie muito particular de magia que acontece quando o grupo começa a tocar – não é grande cartão de visita para um suposto cronista, mas é a mais fiel descrição da realidade.
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Uma amiga, igualmente fã, disse-me uma vez que os 5ª Punkada eram importantes para cada pessoa porque conseguem esse feito incrível de significarem coisas diferentes para cada uma delas, mesmo mantendo-se iguais a si mesmos. A frase pode não ter sido exatamente assim e foi certamente acompanhada por um conjunto apreciável de interjeições, nem todas aconselháveis a menores de idade, daquelas que só dedicamos às coisas que valorizamos realmente… mas é assim que a escolho recordar. Cada um tem os seus 5ª Punkada, isso lembro-me bem de ela ter dito, e eu não podia concordar mais.
Para vos falar dos ‘meus’ 5ª Punkada, tenho de confessar que sou um cínico. Digo-o como quem expressa uma característica, não necessariamente como quem admite um defeito.
O que tento permanentemente é não me tornar um cínico azedo, daqueles que vemos tantas vezes nas nossas relações sociais ou até no comentário televisivo… E a banda é um dos melhores antídotos que encontrei para o azedume, levando-me a suspender o cinismo uma e outra e outra vez. Os ‘meus’ 5ª Punkada serão, por isso, cura.
Não tenho propriamente explicação para esse facto, mas acredito que não estou sozinho nessa convicção: muitas vezes, nos espetáculos, olho para as caras de quem está no público e posso garantir que não há um único cínico naquele espaço, naquele momento. Quando o Fausto Sousa – veterano de 30 anos nesta vida da música, personificação da resiliência antes de esta se ter tornado uma palavra da moda – começa a cantar, não precisamos de perceber as suas palavras para ter a certeza de que são as mais importantes alguma vez ditas. Porque há verdade na sua voz, como há verdade na forma como cada elemento da banda se dedica a essa função tão altruísta de entreter os outros (mesmo sabendo todos nós que o rock é também um exercício de ego).
E há também amor. Muito amor. Amor à música, tão central em tudo aquilo que os 5ª Punkada já fizeram e ainda hoje a verdadeira força-motriz da banda. Mas sobretudo amor no sentido mais geral. Amor que vai muito para lá daquele que é descrito por tantas canções pop desinteressantes, um amor maior, porque é um amor que cria comunidade. Que une e que (nos) muda. Ainda não consegui encontrar forma mais precisa de definir: 5ª Punkada é amor.
Por isso vos digo que, se ainda não conhecem a banda ou não a viram tocar ao vivo, não podem deixar de estar no concerto de celebração do seu 30.º aniversário, no dia 18 de dezembro, no Convento São Francisco. Sejam ou não cínicos.
Opinião | Pedro Santos – Especialista em comunicação
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