Arganil precisaria de 500 sapadores para cumprir lei da limpeza florestal
Proprietários, autarquias e empresas acreditam que a lei das limpezas de terrenos é impossível de ser aplicada na íntegra e em Arganil, se não tivesse havido incêndios, o município precisaria de 500 sapadores para cumprir a legislação.
Os proprietários têm até quinta-feira para limpar as áreas envolventes a casas isoladas, aldeias e estradas. Depois desse dia, são as autarquias que se substituem aos proprietários que não tenham feito a limpeza e têm de garantir todos os trabalhos de gestão de combustível até dia 31 de maio.
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No entanto, no terreno, principalmente no Interior, onde estão as grandes manchas florestais do país, surgem diversos problemas associados ao cumprimento integral desta lei.
As empresas que garantem a limpeza não têm recursos humanos para dar resposta a toda a procura, alguns proprietários não retiram rendimento suficiente dos terrenos para garantir essa operação e os municípios do Interior queixam-se de uma lei desequilibrada, deixando-os responsáveis por uma empreitada que exige recursos humanos e financeiros que não têm.
Um dos exemplos mais claros da dificuldade da intervenção surge em Arganil, um concelho do distrito de Coimbra onde há 400 quilómetros de estradas municipais – grande parte em zona montanhosa – e que foi muito afetado pelo incêndio de outubro de 2017.
Segundo contas do presidente da Câmara, Luís Paulo Costa, se não tivesse decorrido o incêndio, o município teria de garantir a limpeza de 4.000 hectares, entre estradas, aglomerados populacionais e à volta das três zonas industriais e parque de campismo.
“Partindo do pressuposto que uma equipa de sapadores florestais [cinco elementos] limpa um hectare por dia, para fazer 40 dias [intervalo entre 15 de março e 31 de maio] dava-nos 100 equipas a trabalhar em permanência”, afirmou à Lusa o autarca.
Para Luís Paulo Costa, seria “completamente impensável e não existem recursos humanos para isso. Nem falo da questão financeira”.
Em 2018, face ao incêndio, o município terá de limpar apenas 800 hectares, mas, mesmo assim, será um “exercício muito difícil”, estando ainda em fase de obtenção de orçamentos, visto que a autarquia não tem uma equipa própria de sapadores.
“O concelho tem cerca de 12 mil habitantes, com 180 aldeias. Não é tarefa fácil. O esforço é manifestamente desigual, porque a área florestal destes territórios [no Interior] tem um peso muito grande. Em Arganil, ultrapassa os 75% da área total do concelho”, notou.
De acordo com Luís Paulo Costa, a lei, “em muitos aspetos, é desequilibrada”, considerando que o Estado tem de assumir “um papel interventivo”.
Para além disso, a lei obriga a uma limpeza nas estradas a 10 metros para cada lado na horizontal, sendo que num concelho como Arganil, a ser cumprida, traria diversos problemas, nota.
Em zonas de montanha, as árvores “são essenciais para a fixação dos solos e são também um elemento de segurança absolutamente determinante”, uma espécie de “rails’ de proteção naturais” – os outros custariam “nove milhões de euros” -, sublinhou.
Para além disso, há também o impacto negativo que poderia ter para o turismo.
Na estrada para o Piódão, que serpenteia a montanha, se a lei fosse cumprida na íntegra, “significava ter a montanha sem árvores e com a vegetação muito controlada”, e a Selada das Eiras, uma estrada com as árvores a fazerem um túnel que “aparece em todos os postais”, desaparecia.
“Essas coisas não vão deixar de existir, nem nós o vamos permitir”, vincou Luís Paulo Costa.
Em Montemor-o-Velho, a Silvokoala, empresa focada nos trabalhos de gestão de combustível, tem recebido mais interesse de particulares, mas não há capacidade de resposta.
O sócio-gerente, Nuno Valente, terá de se encarregar ele próprio de fazer a limpeza dos seus terrenos.
“Tenho que ir eu fazer alguma coisa. Estamos lotados com os nossos habituais clientes, que nos têm preenchido bastante e cada vez mais”, esclareceu.
Para Nuno Valente, o setor não terá capacidade para responder aos pedidos, até porque “há poucos recursos humanos” com formação para este tipo de trabalhos.
Já a associação de proprietários florestais CAULE, da Beira Serra, entende que haverá dificuldade de alguns proprietários em limpar os terrenos.
“Há pessoas, há terras – talvez a maioria -, que não dão rendimento para estas limpezas e põe-se aqui um problema: O que é que as pessoas fazem perante uma situação destas? Ficam com este ónus para toda a vida? Vendem o terreno? Doam o terreno? O que fazem? É uma questão altamente problemática e que tem de ser devidamente equacionada pelo Governo”, disse à agência Lusa o presidente da associação, Vasco Campos.
Porém, congratula-se por o Governo estar a “fazer aquilo que todos os governos deviam ter feito ao longo dos anos, que é esta pressão sobre a sociedade”.
“É um descuido de toda a sociedade. Desde os proprietários aos municípios aos governos, é geral e transversal e não é de agora, é de sempre”, notou.
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