Coimbra

Alterações climáticas vão tornar cultivo do eucalipto impraticável em regiões de Portugal

Notícias de Coimbra | 6 anos atrás em 02-11-2018
 

 

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 As alterações climáticas poderão tornar o cultivo do eucalipto “virtualmente impraticável” no Sul e em algumas zonas do Centro, o que poderá levar a um aumento das plantações no Norte e a um consequente conflito com áreas protegidas, concluiu um estudo.

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Segundo as projeções do estudo, em particular no pior cenário possível de alterações climáticas, “o cultivo de eucalipto será virtualmente impraticável na metade Sul do país”, disse à agência Lusa Ernesto de Deus, investigador do Centro de Ecologia Aplicada da Universidade de Lisboa e um dos autores do artigo científico que conta com a participação de cientistas de instituições de Coimbra, Porto e Madrid.

Num momento em que o Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas refere que o mundo está atualmente no trajeto do pior cenário, o estudo procurou perceber os impactos das alterações climáticas nas plantações de eucaliptos e os possíveis conflitos futuros com áreas inscritas na Rede Natura 2000 na Península Ibérica.

No pior cenário, para além do sul do país, também parte do distrito de Castelo Branco e da zona do Médio Tejo poderá perder a capacidade para o cultivo do eucalipto face às alterações climáticas no espaço de 30 anos. Quando as projeções são calculadas até 2070, a área propícia para o cultivo desta espécie reduz-se ainda mais na zona sul da região Centro.

“A confirmarem-se as nossas projeções, várias regiões onde atualmente as plantações proliferam tornar-se-ão pouco aptas para o cultivo desta espécie. Colocamos a hipótese destas plantações serem abandonadas, à semelhança do que vemos com frequência por todo o país. No entanto, a espécie de eucalipto utilizada em Portugal resiste a uma grande amplitude de condições ambientais e, portanto, é possível que, apesar de fraca produtividade, os indivíduos desta espécie sobrevivam”, sublinha Ernesto de Deus.

No estudo publicado no Journal For Nature Conservation, os investigadores notam que, em 2070, espera-se uma redução para 55% do território onde há boa capacidade de cultivo do eucalipto atualmente. No entanto, nos dois cenários usados para as projeções, haverá um aumento da capacidade de cultivo de eucalipto no noroeste e norte da península, até ao Mar Cantábrico.

Para além de um impacto negativo no cultivo de eucalipto a Sul, as alterações climáticas deverão implicar um aumento das plantações a Norte, que deve ser acompanhada por uma migração forçada de várias espécies animais e vegetais.

Estas possíveis dinâmicas projetadas pelo estudo reforçam também a necessidade “de criação de novas áreas protegidas nas regiões a norte” do país, realça Ernesto de Deus.

Face a estas previsões – aumento de produtividade do eucalipto a norte e migração de espécies para essa região – as análises dos investigadores indicam que os conflitos entre plantações e áreas de elevada biodiversidade vão aumentar em algumas regiões, nomeadamente no Norte, por forma a suster uma possível quebra da exploração de eucalipto a Sul.

No entanto, há várias incertezas, nomeadamente “as políticas florestais e ambientais, as dinâmicas dos mercados, a utilização de outras espécies florestais (incluindo outras espécies de eucalipto) e até os avanços na manipulação genética da espécie. Qualquer um destes pontos pode melhorar ou agravar o problema”, acrescenta o investigador.

Quanto aos conflitos com zonas inscritas na Rede Natura 2000, o estudo sublinha que as áreas de eucaliptal aumentaram em alguns sítios protegidos por este instrumento, bem como na envolvente dessas zonas, de acordo com dados até 2007 (não há registo da última década).

“Neste estudo confirmámos que muitos sítios da Rede Natura 2000 já acolhiam eucaliptais quando foram criados, embora a uma pequena escala como seria de esperar. No entanto, e apesar de termos analisado uma pequena amostragem de sítios Natura 2000, verificámos que a área de eucaliptal aumentou nalguns sítios após a sua designação enquanto áreas protegidas”, salienta Ernesto de Deus, referindo que uma incógnita é saber se esse aumento teve origem em novas plantações ou a partir de plantações existentes.

No estudo, foram identificados 77 sítios da Rede Natura 2000 com área ocupada por eucaliptal, sendo que dois dos casos mais graves são o Sítio de Monchique (com mais de 25 mil hectares de eucaliptal – um terço da área) e o Sítio de Valongo (com metade da área ocupada por eucaliptos).

Para além da presença das espécies nas áreas protegidas, o estudo concluiu também que, entre 1990 e 2007, a área ocupada por eucalipto aumentou 48% na envolvente (a menos de um quilómetro) dos sítios da Rede Natura 2000.

“A envolvência destas áreas protegidas tem sido claramente negligenciada. Não podemos encará-las como ilhas de biodiversidade. São e devem ser sistemas abertos, mas estão vulneráveis a riscos externos. As plantações de eucalipto em redor dos sítios poderão ter impactos como: o aumento do risco de incêndio; a invasão de áreas vulneráveis; homogeneização da paisagem e redução da biodiversidade; fragmentação de habitats e limitação do movimento das espécies; alterações nos processos hidrológicos”, disse.

Questionado pela Lusa, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) referiu que com a entrada em vigor do Regime Jurídico Aplicável às Ações de Arborização e Rearborização (RJAAR) passou a ser possível “o controlo, a avaliação e a monitorização das ações de arborização e de rearborização com espécies florestais”.

No entanto, refere que não tem informação sobre possíveis pareceres positivos que o ICNF tenha dado para plantação de eucaliptos em sítios rede Natura 2000.

Na resposta enviada por ‘e-mail’, também não esclarece quantas ações de fiscalização é que ocorreram em sítios da rede Natura 2000 nos últimos cinco anos.

O ICNF afirma apenas que foram levantados 2.091 processos de contraordenação a nível nacional, não sendo possível apurar quantos desses processos se inseriam em rede Natura 2000.

“De referir que a larga maioria de processos de contraordenação levantados no âmbito do RJAAR dizem respeito essencialmente à realização de ações de rearborização sem autorização prévia”, sublinha.

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