Opinião

A vida dos outros

OPINIÃO | Angel Machado | 1 semana atrás em 10-09-2024

É provável que tenhamos algum tipo de prazer durante a vida, mesmo àqueles que se julgam infortunados. Mas a vida dos outros, às vezes, gera uma curiosidade incontrolável. A sensação é de que eles vivem coisas extraordinárias, além do básico que, obviamente, conhecemos. No meu entendimento a discrição é um luxo, mas, atualmente não é tão praticada pelas pessoas, tanto na vida digital ou fora dela. 

PUBLICIDADE

Há momentos que são comuns – o nascer, o viver e o morrer. Não falo da forma como cada um chega à vida, mas, da grande oportunidade de estar presente e viver. Mas, somos seres condensados de virtudes e vícios e ao longo do percurso demonstramos o que isso significa.

Revelamo-nos diariamente, no momento em que espiamos pela janela o que o vizinho anda a fazer e queremos saber porquê. O “será” é uma incógnita e isso alimenta a alma invadida pela inveja ou curiosidade. Por que, às vezes, achamos que a vida dos outros é melhor que a nossa? O que poderia ser tão bom, que me faz querer ter a vida deles e não a minha.

PUBLICIDADE

Não somos assim tão bem-educados. Os bons modos não mudam o jeito como olhamos e sentimos a vida, e a educação pode ser apenas uma boa prerrogativa para os nossos maus olhados, nem sempre discretos. É libertador admitirmos que somos falíveis mesmo quando tentamos ser coerentes. 

Há na existência divina uma esperança peculiar de que sejamos bons por inteiro; se cometermos algum pecado confessámo-nos e somos liberados para novos delitos, a nossa humanidade é assim, complexa. Cremos na conveniência e admiramos com desdém a vitória do vizinho. Nos tempos de agora, dizem que gente feliz não incomoda ninguém, o que me faz pensar sobre a infelicidade que alimentamos. 

PUBLICIDADE

E não importa o grau de escolaridade, o nível social, a conta bancária, as belas fotografias e o sucesso estampados nas redes sociais, a perfeição já não nos convence mais, embora atice o nosso pior. Os que vivem – bem ou mal -, não rejeitam a possibilidade de se transformarem em santos depois de morrerem. Viver a vida dos outros é uma espécie de voyeurismo psicológico, introspeção de “A Janela Indiscreta” (1955), de Alfred Hitchcock. A vida dos outros tem a vantagem de, por alguns instantes, nos fazer esquecer a nossa, se isso alguma vez é possível.

Como dizia a roqueira brasileira, Rita Lee, “resolver a vida dos outros é fácil”, mas não se esqueça que “vida dos outros”, também, é a nossa. 

Related Images:

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE