Opinião
A segunda vida dos mortos
Há duas coisas que dizem resistir ao tempo: o livro – uma espécie de memória -, e a esperança – um sentimento que parece resgatar qualquer pessoa da mortalidade.
O que o homem não sabe, ele inventa, e quando a vida não é o suficiente, inventamos os mortos para nos sentirmos especiais, com a vantagem de que eles não falam sobre os vivos.
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Podemos admirar ou resistir ao destino – viver baseia-se em nascer, contruir uma história e morrer. Mas, nesse tempo em que podemos acreditar no que quisermos sem o receio do constrangimento, a liberdade tornou-se um punhal.
É fácil atribuir a poderes sobrenaturais a existência dos mortos para além das fotografias, da ausência física e da força da imaginação. Confrontar o que é dado como certo, para o homem, pode ser uma história com final feliz. Gosto que pensem por mim, com o meu consentimento. Pensar por si só é um grande esforço, é necessário ter coragem e compreender o que o intelecto diz sobre ser crítico. O sintoma dessa fragilidade é uma vida sem causa e, também, a inexistência de resposta ao estímulo racional.
Quando era estudante de comunicação social, a porta que se abriu foi a solidez do pensamento – comecei a estudar o filósofo e educador canadense, Marshall McLuhan. Um importante teórico da área de comunicação, famoso por ter cunhado o termo “aldeia global”; ele previu os fenômenos sociais e filosóficos gerados pelos computadores e pelas telecomunicações antes mesmo de a internet ser inventada.
“O termo “aldeia global” significa, basicamente, que os meios de comunicação fariam com que o mundo se tornasse uma grande aldeia, quebrando fronteiras geográficas, culturais, sociais e de outros tipos. Apesar de a internet ainda não ser viável comercialmente quando McLuhan desenvolveu essa teoria, ele já previa o que aconteceria nos anos futuros”.
Na prática, a massa tem cada vez mais adeptos e nessa condição, é preciso, apenas, respirar. “A massa é extraordinariamente influenciável e crédula, é acrítica, o improvável não existe para ela. Pensa em imagens que evocam umas às outras associativamente, como no indivíduo em estado de livre devaneio, e que não têm a sua coincidência com a realidade medida por uma instância razoável,” a segunda vida de Sigmund Freud (1856-1939) está no seu pensamento do século passado a convergir com o século 21.
A segunda vida dos mortos baseia-se em nascer, construir uma história “edificante” e não morrer em vão. Para ser lembrado como um mortal, será preciso quebrar o paradigma de uma existência vazia. Há muitos protagonistas candidatos a uma segunda vida, a dificuldade vai ser fazer escolhas.
OPINIÃO | ANGEL MACHADO – JORNALISTA
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