Opinião

A Europa que me lixa 

Notícias de Coimbra | 5 meses atrás em 15-06-2024

A Europa está em polvorosa e quem se lixa sou eu, que, em semanas como esta – em que o trabalho se avoluma e não me dá tempo para acompanhar, com a devida  calma, todos os acontecimentos relevantes -, não consigo concentrar a minha  atenção num único tema. Ela é nas eleições, ela é no futebol, ela é na guerra… a  Europa está na berra, anda por todo o lado, e não consegue descansar, obrigando me a mim – que me interesso por ela – a realizar contorcionismos oculares só ao  alcance dos camaleões mais dotados. 

Perante esta overdose de tantas e tão ricas temáticas europeias, fico hesitante,  indeciso, incapaz de escolher uma só matéria e encontrar uma perspetiva original,  com méritos suficientes para concorrer com as incontáveis opiniões publicadas  em Portugal, um país de tão brandos costumes quanto firmes posições. 

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Devo falar sobre o quê, então? Falo da vitória tangencial de Marta Temido? Da  necessidade de enquadrar Cristiano Ronaldo na seleção  sem condicionar as dinâmicas coletivas? Do flagrante desnorte da aliança  transatlântica face à urgência de reforçar os meios da defesa ucraniana? 

Já escolheste o tema desta semana?” – pergunta-me o Grilo Falante, a  consciência que alerta para o tique-taque imposto pelo prazo assumido. A  pergunta ressoa e o seu eco suscita os instintos mais práticos (ou esquizofrénicos)  do meu cérebro que, num tom cada vez mais urgente, me grita: “Vá lá, Bernardo…  daqui a nada é quinta-feira e, se não tratas agora do texto, não tens tempo para  escrever alguma coisa de jeito”. 

Entretanto, o tempo corre, desaparece. Quando dou por mim, é quarta-feira, altura  de pôr os dedos no teclado e escrever… sobre qualquer coisa. De preferência sobre  a Europa que, nos últimos tempos, tem colhido todos os focos da atenção  mediática. 

Devo, portanto, avançar para uma análise das eleições europeias e comentar a  crise de popularidade de Emmanuel Macron que resultou na marcação de eleições  antecipadas e que, com grande probabilidade, provocará a derradeira ascensão da  extrema-direita em França? 

Ou será mais oportuno tentar compreender o fenómeno que leva o PSD a apoiar a  candidatura europeia de António Costa? 

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A ideia de refletir sobre a Europa, aprofundando a perspetiva de um português à  frente dos destinos do Velho Continente parece promissora. Parece, aliás, não só  promissor, como complexo, este exercício de captar o ziguezague argumentativo  de Luís Montenegro, um homem que desprezava os talentos do Primeiro-Ministro 

António Costa, mas que acredita muito no potencial do Presidente do Conselho  Europeu António Costa. 

Talvez a escolha do atual primeiro-ministro se prenda com o contexto espaço tempo. Assim como os gelados são destinados à época de verão e o ski  é praticado entre a neve e a montanha, as habilidades de António Costa serão  melhores quando aplicadas a partir de Bruxelas. Aqui, em Portugal,  eram indigestas ou até perigosas, mas por lá, no epicentro da União Europeia, as  receitas do nosso ex-primeiro ministro podem ser muito apreciáveis ao palato  deste grande projeto comunitário que é a Europa, considerará Luís Montenegro. 

“E o Zelensky? Se é para falar da Europa, vamos falar da Ucrânia.” – poderão  questionar os leitores mais opinativos. Desculpem, mas não arrisco a pele a falar  sobre a Guerra na Ucrânia… quem me garante que entre os mais de 350 mil  seguidores do Notícias de Coimbra não está um espião do Kremlin!? Quem  me assegura que esta semana estou a insultar o Putin numa inocente crónica, e  que, na semana seguinte, não estou nas manchetes do Notícias de Coimbra, CNN ou Expressos desta vida, como protagonista de uma morte trágica, contranatura e,  claro, “acidental”? 

Desfocar da Europa e refletir, por exemplo, sobre a evolução do conflito israelo árabe também não seria a melhor alternativa. O risco de divagar na complexidade  do sionismo ou do Islão, e acabar numa atrapalhação capaz de ofender judeus e  muçulmanos de uma assentada, é suficientemente dissuasor. 

Desisto, por fim, de olhar para a minha Europa no meio de tanta euforia e  turbulência. A Europa que se concentre num tema de cada vez… que pare de me  lixar o cérebro e que me aponte um caminho só: ou os votos, ou a bola, ou os  mísseis, qualquer coisa, mas um só tema de cada vez. 

Aí, porventura, com um único foco, talvez eu consiga partilhar uma opinião  interessante e bem fundamentada. Até lá, é pouco provável.

OPINIÃO | BERNARDO NETO PARRA

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