Opinião
A corrupção e os governos
LÚCIA SANTOS
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Todo e qualquer homem que tem acesso a poder, independentemente do tipo e da forma e da sua maior ou menor capacidade de influência, é tentado a abusar deste. Da mesma forma, todos os governos são igualmente susceptíveis de corrupção. Como disse Montesquieu, em Espírito das Leis, o sistema é corrupto por natureza, independentemente do regime político: a democracia desagrega-se se os cidadãos se tornam ambiciosos e deixam de respeitar as leis, a monarquia corrompe-se quando o monarca esquece as leis imutáveis que limitam o seu poder e se transforma num tirano e o despotismo não subsiste senão por um tempo breve, enquanto o déspota impõe a sua vontade pela força.
Num ranking de 176 países analisados pela organização não governamental Transparency International, Portugal ocupa o 33º lugar no Índice de Percepção da Corrupção 2012, mas, quando comparado apenas no contexto da União Europeia, Portugal surge em 15º lugar, tendo abaixo apenas alguns países da Europa de Leste, Grécia, Itália e Malta.
Esta realidade ganha outra expressão quando no mesmo ano num estudo da associação Transparência e Integridade mais de metade dos portugueses considera que o governo está nas mãos de um conjunto restrito de grupos económicos e teme que as decisões políticas sejam tomadas sem independência, favorecendo esses mesmos grandes interesses económicos.
Muitas são as razões apontadas para esta tão dramática realidade.
Um dos principais problemas associados à corrupção é a inadequação da legislação nacional. Os mecanismos legais existentes são confusos, repletos de regras e de excepções que ninguém percebe e com um elevado poder discricionário para quem aplica a lei.
Dados pouco fidedignos, falta de especialização neste tipo de criminalidade por parte das autoridades judiciais portuguesas, escassez de recursos para a sua investigação, fraca protecção concedida a quem denuncia casos de corrupção e deficiências nas sanções previstas para este crime constituem outros dos inúmeros problemas associados.
Mas um problema grave é também a crescente demissão da população da sua tarefa de juiz de todo este processo, sendo por isso necessário relembrar todos da importância do envolvimento dos cidadãos na luta contra a corrupção. Para atingir este objectivo urge reforçar a dimensão cívica da questão, devendo para isso ser utilizados todos os meios disponíveis para esta tão necessária consciencialização.
De facto, embora a fiscalização seja algo de incontornável e por isso seja necessária a criação de leis que limitem o poder e estabeleçam barreiras, é sobretudo forçoso actuar na raiz do problema e investir na educação do cidadão, para que este aprenda a virtude e reconheça a importância de participar activamente no combate à corrupção.
Não há reforma do Estado ou alternância de poder que nos sirva de alguma coisa enquanto não conseguirmos dar dignidade e seriedade à coisa pública. Esta sim devia ser a luta de todos nos próximos tempos.
LÚCIA SANTOS
Presidente da Juventude Popular de Coimbra
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