Os bombeiros da corporação de Castanheira de Pera que ficaram feridos com gravidade no incêndio que deflagrou em Pedrógão Grande em junho de 2017 querem voltar ao ativo e não esquecem a solidariedade de que foram alvo.
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Naquele sábado, 17 de junho, cinco bombeiros – o chefe Fernando Tomé, o subchefe Rui Rosinha, Fernando Paulo Tomé, Filipa Rodrigues, que ficaram feridos, e Gonçalo Correia, que viria a morrer – seguiam numa viatura que foi abalroada por um ligeiro na estrada nacional 236-1, via onde faleceram 47 pessoas devido ao incêndio.
Dos quatro, Fernando Paulo Tomé é o único que já regressou ao serviço ativo, mas os restantes, ainda em fisioterapia, também ambicionam voltar, embora antecipando eventuais limitações.
“Eu quero voltar aos bombeiros, com algumas limitações. Mas o meu papel, sou chefe, ou motorista, é mais é mais um bocadinho à distância, mas, mesmo assim, agora as primeiras vezes tenho de ter alguma precaução. Mas quero fazer o que puder, a população merece”, disse à agência Lusa Fernando Tomé, bombeiro há mais de 30 anos.
Fernando Tomé adiantou nunca ter imaginado a situação em que acabou ferido e hospitalizado – com ferimentos nas mãos e vias respiratórias – desde logo por não ter sido em “combate direto” ao fogo mas sim após um acidente de viação e lembra que os bombeiros queimaram-se “sem chama direta, só com o calor”.
“Sei que o calor pode ferir assim, mas com a distância tão grande que estávamos do fogo, queimarmo-nos desta maneira nunca pensei. Era um fogo fora do normal, nunca vi uma coisa assim. Eu e muitas pessoas nunca vimos tal coisa. Nem nunca aconteceu morrer tanta gente desta forma, uns queimados, outros com o calor, outros intoxicados”, enfatizou, aludindo aos 65 mortos registados naqueles dias.
Já Filipa Rodrigues, 25 anos e que é bombeira há sete, também não equaciona deixar a função, mas sim em deixar de acudir a incêndios florestais, ela que a 17 de junho de 2017 pensou “que o mundo ia acabar” porque “tudo ardia ao mesmo tempo”.
“As partículas que voavam a arder, o fumo, o vento, nunca tinha visto [algo assim]. Já fui a alguns fogos, mas nunca tive assim nenhum momento em que pensei que é desta que não volto”, recordou.
Fora dos incêndios, seja no transporte de doentes ou na emergência pré-hospitalar, Filipa quer “ao máximo” fazer formação e recomeçar o serviço.
O subchefe Rui Rosinha, que esteve seis meses internado, dos quais dois meses e meio em coma e que sobreviveu a 14 cirurgias, leva 25 anos de bombeiro e, a exemplo dos seus companheiros, apesar de “todas as situações de aperto” que viveu no combate a fogos, nunca experienciou um incêndio florestal como o de junho de 2017.
“Nada com aquela violência, nada que se compare sequer. Nem sabia que aquilo poderia alguma vez acontecer, não fazia ideia que a Natureza pudesse ser tão violenta num incêndio”, argumentou.
Do que lhe contaram dos meses em que esteve em coma, Rui Rosinha enaltece o apoio que chegou à zona afetada pelos incêndios de Pedrógão Grande “de todo o país e de todo o mundo, do Canadá, Espanha, França, Portugal inteiro”.
“As pessoas responderam de forma muito inequívoca e disseram presente, e a nível político foram dados passos importantes. Agradeço muito a toda a gente que deu o que pode e muitos, se calhar, o que não podiam, estou eternamente agradecido a toda a gente”, afirmou.
O chefe Fernando Tomé pormenoriza a “grande força e apoio, todos os dias” que a direção, o comando e os colegas bombeiros de Castanheira de Pera têm manifestado, também na recuperação dos ferimentos que sofreram, a exemplo da população local e dos vizinhos de Pedrógão Grande e Figueiró dos Vinhos.
“Muita gente que nos conhece que vem saber como é que estamos, se estamos a recuperar, se precisamos de alguma coisa, temos esse carinho”, destacou.
Já no ativo desde janeiro, Fernando Paulo Tomé, filho do chefe Tomé, está ainda “limitado” a nível físico, não vai integrar o dispositivo deste ano de combate a incêndios, mas presta outros serviços na corporação.
Lembra que o que aconteceu “tem sempre um reflexo negativo, mas também positivo, porque vem reforçar o ser bombeiro”.
“Nós não assinámos um protocolo com a instituição, assinámos um protocolo com Portugal, de ser bombeiro voluntário. Um bombeiro voluntário faz de tudo um pouco dentro dos bombeiros, desde emergência pré-hospitalar, a incêndios e inundações e tudo o que aconteceu, um ano depois, veio reforçar ainda mais o que já existia e, daqui para a frente, é reforçar ainda mais para que tudo seja mais positivo”, argumentou.