Opinião
Procriai donas de casa, procriai!
Dizem-me que anda aí um livro que desatina na “arte do prazer” e eu, confesso, ainda não tive tempo de o comprar, o que farei imediatamente mal a minha redução de dez euros no IRS me seja disponibilizada.
Entretido a aspirar a casa, limpar a louça e arrumar o quarto do meu filho, é verdade que me falta o tempo, mas quero ler tamanho escrito que aponta a essa legislação “que facilita o divórcio”, contesta a procriação medicamente assistida num país em declínio demográfico e defende “a família tradicional”, aquela em que o marido faz trabalhos domésticos, mantém vida profissional, bebe vinho e come toucinho, mas não recebe salário de dono de casa.
Estas pessoas, algumas das quais a quem pagamos prebendas republicanas, dizem que isto importa à formação da identidade. E eu, com um filho de 14 anos que ainda por cima me saiu marialva, procuro respostas nessa bateria de conservadores e clérigos, que me consigam esclarecer.
O país, este Portugal, precisa de escancarar as janelas, tal o bafio e mofo que nos advém de uns fundamentalistas, aiatolas dos bons costumes, que não pregam contra o brincar às escondidas. Como a comenda dada aquele marechal que o meu amigo Godinho levou de helicóptero militar a fugir de Portugal.
É triste esquecermo-nos que o 11 de março de 1975 foi uma golpada, derrotada, mas uma golpada. Na privacidade da secretaria onde aceite consultas para os amigos doutores, ao escuro e camuflado, deram um colar ao Spínola. O da Liberdade.
Porra, é incrível a pontaria. Depois de um vice-presidente parlamentar, um colar. A coisa instala-se, e ninguém prega contra a cobardia para fazer a reforma da justiça. Veja-se, logo após a tomada de posse, o magistério público veio incidir no Luz, umas negociatas. Um recordatório para se perceber a mão que segura a marioneta.
Perante isto, apetece colocar no país inteiro aquele semáforo que inventaram para as Cortes, para garantir os tempos das intervenções no Parlamento e desligar os microfones, esgotado o cronometro. Podiam calibrar este instrumento para o disparate, mas não.
Também não se preocupam com o dinheiro húngaro na golpada da imprensa, com ajuda dos conservadores que querem Putim no poder e ir remoendo a União Europeia, enquanto recebem os fundos. E destes, alguns até já estão no Governo, depois de deixada a empresa do Mário e do Pedro.
São 45 milhões de euros e se a isto juntarmos o sumidouro de Portugal da nossa elétrica, vemos a sovietização em curso, como apregoaram lá no tal lançamento do livro, enquanto eu limpava o pó. Mas é uma outra sovietização.
Cinquenta anos depois de Abril, ver estas manobras, as aldrabices e moscambilhas para tomar o poder e posteriormente, honrá-lo com comendas, enoja.
Só falta o grito para procriar. Deve ser esse o espírito do salário para as donas de casa. Procriar. De pé, preferencialmente.
Que caruncho, com o mundo aflito, aldrabices, tangas e conversa de sacristia. Antes o putedo, mais claro e objetivo, e o serviço militar obrigatório, mais educativo e cívico. Tudo isso a estes artistas embromados.
OPINIÃO | AMADEU ARAÚJO – JORNALISTA
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