Crimes
Relatório europeu mostra ceticismo no combate à corrupção em Portugal
O relatório do grupo GRECO sobre corrupção hoje divulgado “mostra o ceticismo dos avaliadores internacionais” para com “um vício antigo em Portugal” de “fazer muitas leis e implementar poucas ou nenhumas”, defendeu o vice-presidente da associação Frente Cívica.
“O que este relatório mostra é que os avaliadores externos estão bastante céticos em relação a um país que passa a vida a aprovar leis e depois não implementa as leis que aprova, no caso estamos a falar de leis de prevenção da corrupção ao nível do Governo que dependem de instituições que não estão a funcionar”, disse o vice-presidente da Frente Cívica, João Paulo Batalha.
Nomeadamente, no relatório da 5.ª ronda de avaliação do Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO), do Conselho da Europa, é apontado que a legislação assenta em instituições que ainda não estão a funcionar na sua plenitude, como o Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC) e a Entidade para a Transparência, que, referiu João Paulo Batalha, têm “um papel fundamental no que toca à fiscalização da integridade dos responsáveis governamentais”.
Para João Paulo Batalha, este relatório “mostra que esta estrutura de combate à corrupção assenta em leis que depois ao não se traduzirem em nada na prática são uma ficção de prevenção e de combate à corrupção”.
O GRECO do Conselho da Europa apelou hoje a Portugal que melhore a eficácia do sistema para prevenir a corrupção nas principais funções executivas do Governo e nas agências de aplicação da lei.
O GRECO reconhece que Portugal desenvolveu um extenso quadro jurídico e institucional anticorrupção, mas a eficácia deste quadro depende fortemente da plena operacionalidade do MENAC e da Entidade para a Transparência, o que ainda não aconteceu.
O relatório sublinha que todas as pessoas com funções executivas de topo devem ser sujeitas a verificações de integridade eficazes antes de ingressarem no Governo, bem como a restrições pós-emprego, e devem ser obrigadas a apresentar declarações de bens e interesses.
Outra questão que preocupa o GRECO é a transparência dos contactos entre altos funcionários executivos, lobistas e terceiros, que o organismo do Conselho da Europa considera que merece mais avanços.
Sobre esta matéria, João Paulo Batalha referiu que o GRECO “reconhece que esta é uma área completamente nebulosa em que as influencias sobre as decisões públicas e sobre a legislação se fazem sem controlo e, portanto, sem capacidade de escrutínio”, sendo “uma lacuna grande que precisa de ser corrigida”.
O responsável lamentou a forma como o parlamento português “à última hora iniciou um processo legislativo” sobre o lobby, algo que “não aconselha grande celebração”, pela ausência de discussão pública, o que já aconteceu anteriormente e “com um resultado sempre insuficiente ou mau”.
Apesar de não acreditar que a legislação em discussão ainda venha a ser aprovada nesta legislatura, João Paulo Batalha aponta, no entanto, “uma lacuna muito grande, que é deixar de fora os advogados, que são os grandes lobistas em Portugal”.
A legislação em discussão proíbe, à partida, os advogados de fazerem lobby, referiu, mas não proíbe que mantenham reuniões com decisores políticos no âmbito dos seus atos próprios, algo que não é fiscalizado e que, na prática, permite aos advogados continuarem a fazer lobby, “mas sem estarem sujeitos às regras de transparência, aos registos das reuniões e aos processos escrutináveis que são a marca da regulação que se pretende impor”.
João Paulo Batalha sublinhou que a legislação em discussão tem “como impulso fundamental a Operação Influencer”, processo no âmbito do qual foi constituído arguido Diogo Lacerda Machado, advogado e melhor amigo do primeiro-ministro, cuja defesa alegou estar a fazer aconselhamento jurídico para a empresa que o contratou, portanto a exercer a sua atividade.
“É muito duvidoso que aplicando-se a lei que está em discussão esta penalizasse de alguma maneira, ou permitisse sequer conhecer de forma escrutinável, o comportamento de Lacerda Machado e as reuniões que teve”, disse
“Se estamos a fazer uma lei em reação ao caso da Operação Influencer e percebemos que a lei que está a ser feita dificilmente preveniria o caso Operação Influencer estamos claramente a falhar. Isto é um dos problemas que o GRECO claramente sinaliza, que é fazermos as leis de forma pouco pensada, pouco discutida, apressada, mal feita, e depois as leis são inócuas no terreno, ou porque estão mal desenhadas, ou porque não são implementadas, ou pelas duas razões ao mesmo tempo”, acrescentou.
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