Opinião

Somos todos “piratas”?

LÚCIA SANTOS | 10 anos atrás em 28-05-2015

Apesar do Presidente da República já a ter vetado em Março, defendendo uma reponderação da lei para que fosse mais justa para autores e consumidores, a lei da cópia privada foi esta semana aprovada uma segunda vez pela maioria parlamentar (a primeira vez foi em Setembro de 2014), obrigando, assim, o chefe de Estado à sua promulgação, de acordo com o que está consagrado na Constituição da República Portuguesa.

Se, por um lado, o bom senso do Presidente da República o levou a vetar a lei da cópia privada, por outro lado, a maioria parlamentar insiste no erro. Mas que lei é esta afinal que justifica que a maioria ignore desta forma um veto presidencial?

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Esta lei pretende proteger e compensar financeiramente autores, editores ou produtores pela reprodução a título privado de obras protegidas e vai funcionar através da aplicação de taxas (que variam entre os 0,05 cêntimos e os 20 euros) aos equipamentos que reproduzem música e vídeo, como telemóveis, tablets, leitores de MP3, discos rígidos, pens USB e cartões de memória. Esta taxa, que já existe desde 1998 para suportes como CD, DVD e cassetes, passa, assim, a ser alargada a outro leque de aparelhos.

Naturalmente uma lei com estas características é tudo menos consensual, provocando grandes divisões no Governo e na sociedade civil em geral.

Já por muitas vezes manifestei concordância com este Governo, mas também já discordei algumas vezes. Neste particular confesso que estou totalmente contra, parece-me mesmo uma lei absurda, senão vejamos:

– Os equipamentos podem ser adquiridos para outros usos que não o de fazerem cópias privadas de material protegido por direitos de autor. A título de exemplo, tenho vários discos externos completamente cheios de dados de trabalho;

– A forma como as cópias privadas são armazenadas pelos consumidores é cada vez menos baseada em aparelhos e cada vez mais em serviços (as nuvens);

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– Existe o perigo de duplo pagamento, como, por exemplo, nos serviços de venda online que já pagaram a licença de venda;

– Cria efeitos nocivos na economia, ao prejudicar importadores e distribuidores, mas também consumidores, pois embora a taxa não seja paga por estes, mas por quem introduz os produtos no mercado, só muito dificilmente este aumento não será repercutido no preço final dos equipamentos;

– Leva a que os consumidores entendam que não devem pagar pelos conteúdos, uma vez que já pagaram mais pelos aparelhos;

– As empresas em Portugal terão de enfrentar a concorrência das empresas de venda online, onde os preços facilmente poderão ser mais baixos. Confesso que passarei a comprar os meus por essa via.

Com esta lei da cópia privada somos todos tratados como transgressores e o Estado não pode tratar-nos a todos como “piratas” como medida preventiva, não pode passar a mensagem de que se algo serve para prevaricar deve ser taxado por antecipação. Isto é o que vai acontecer a todos os que comprarem um equipamento com capacidade para reproduzir música e vídeo e não tirarem partido dela ou a todos os que simplesmente a usam por motivos profissionais.

O Estado deve existir, não “gordo” e amigo dos “camaradas”, como alguns advogam, mas ágil e eficaz. Deve ter preocupações com o fundamental e nunca ser um caça taxas, principalmente um caça taxas ridículas, como é o caso. Mas, principalmente, o Estado não deve ser absurdo. Absurdo por absurdo (e pedindo desculpa, mas para ridículo, ridículo e meio), espero pelo dia em que os pés de cabra paguem taxa pois podem ser usados em assaltos, que as facas de cozinha paguem taxa pois podem ser usadas em crimes ou que os ratos paguem taxa pois quem acede a sites ilegais pode fazê-lo usando um rato… Haja bom senso!

Lúcia-Santos

LÚCIA SANTOS

Vice-Presidente da Distrital de Coimbra do CDS-PP

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