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Mulher ganha 2,50 euros de subsídio de refeição que “não dá sequer para lanchar”

Notícias de Coimbra com Lusa | 2 anos atrás em 16-04-2023

 Susana Gomes ganha 2,50 euros de subsídio de refeição, o definido para o setor do calçado, que diz que não chega sequer para lanchar, e leva o sindicato SNPICCMA a pedir que seja imposto na lei um valor mínimo.

O subsídio de refeição não é obrigatório, não está previsto no Código de Trabalho. Os trabalhadores apenas recebem esta compensação pelas despesas com a refeição do dia de serviço efetivo se tal estiver previsto no contrato coletivo de trabalho ou no contrato individual. De contrário, as empresas não são obrigadas a pagar.

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Contudo, mesmo com o subsídio definido em Contrato Coletivo de Trabalho (CCT), há setores em que o valor é considerado muito insuficiente pelos trabalhadores. No caso do Calçado são 2,50 euros. No setor dos têxteis, é de 2,40 euros o subsídio estabelecido no Contrato Coletivo de Trabalho para a Indústria de Vestuário e Confeção.

Também no comércio a retalho, onde a contratação coletiva está dispersa por áreas geográficas, há valores semelhantes. Por exemplo, no CCT do comércio do distrito de Lisboa, o valor é de 2,80 euros.

A presidente do CESP – Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal, Filipa Costa, disse à Lusa que já há muitas empresas a pagar acima (sobretudo grandes grupos), mas este valor mantém-se porque o CCT não é revisto desde 2008, desde logo porque as empresas querem aproveitar a revisão para que “os trabalhadores percam direitos”, designadamente no pagamento de horas noturnas.

Susana Gomes trabalha numa empresa de calçado em Santa Maria da Feira (distrito de Aveiro) e recebe os 2,50 euros, um valor que – diz –“nem sequer para lanchar no Continente dá”.

Felizmente, contou à Lusa, vive perto do trabalho e tem a possibilidade de ir almoçar a casa, o que lhe permite poupar dinheiro, mas muitos colegas não o podem fazer, por morarem longe da fábrica. Se não levarem comida, pagam mais do dobro para almoçarem.

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“Hoje comi fora, numa padaria, e com meia sopa, uma sandes e um café gastei quase seis euros, e não pedi bebida”, contou.

A trabalhadora disse que ainda recentemente falou com um dos patrões a pedir aumento do subsídio mas a resposta foi novamente negativa, como é há anos.

“O meu patrão disse-me que nós precisamos da empresa mas a empresa também precisa dos trabalhadores. Eu disse que ainda bem que ele pensa assim, que trabalhamos sempre que a empresa precisa – trabalho extra, mesmo em feriados, porque temos noção de que a empresa tem de cumprir entregas com clientes – e que, se não há um aumento digno de salário, para pelo menos subir o subsídio de alimentação”, contou, indicando que não teve êxito.

Segundo a trabalhadora, a justificação para não haver aumentos é “a crise, há anos que é sempre a crise”. Contudo, critica, “para carros topo de gama já não há crise”.

Os únicos aumentos que a grande maioria dos cerca de 100 trabalhadores têm tido, afirmou, é por via do aumento do salário mínimo nacional. “Com jeitinho ainda tínhamos de pagar para lá trabalhar”, vincou.

Tal como no calçado, também no setor dos têxteis o valor definido no Contrato Coletivo de Trabalho para a Indústria de Vestuário e Confeção é semelhante, ligeiramente mais baixo, de 2,40 euros por dia.

Segundo a presidente do Sindicato Nacional dos Profissionais da Indústria e Comércio do Calçado, Malas e Afins (SNPICCMA), Fernanda Moreira, a subida do subsídio de refeição no calçado tem sido das principais reivindicações sindicais, mas a associação patronal APICCAPS – Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e seus Sucedâneos não se tem mostrado disponível.

Apesar de haver empresas que pagam acima do valor definido no Acordo Coletivo do Calçado, como aquela em que trabalha (há empresas que pagam cerca de cinco euros e algumas até sete euros), a maioria dos trabalhadores recebe os 2,50 euros, afirmou.

Perante a intransigência dos patrões, a dirigente sindical defende que o Estado tem de intervir porque o valor atual não é digno.

“Se realmente não há consciência por parte da associação patronal e dos empresários, então tem de haver interferência por parte do Estado. Assim como há negociações para aumento do salário mínimo, deveria haver um subsídio de refeição mínimo aplicado a todos”, afirmou à Lusa.

“A associação patronal APICCAPS preocupa-se imenso com a imagem, diz coisas bonitas, que o setor calçado é uma arte, e na realidade os trabalhadores são tão maltratados”, disse Fernanda Moreira.

Questionada pela Lusa, a CGTP considera que o subsídio de refeição deve ser “sempre matéria do âmbito da contratação coletiva”, pois cada setor tem especificidades diferentes, considerando, contudo, que na lei geral deve constar a obrigatoriedade do pagamento, disse a dirigente Andrea Araújo.

Para a CGTP, definir um valor na lei geral pode ter efeitos nefastos, pois, afirma a dirigente sindical, quando se define um valor, os patrões “entendem que é aquilo que têm de pagar”, e não que é apenas um valor mínimo.

Sobre os baixos subsídios pagos em alguns setores (no comércio há mesmo contratos coletivos sem subsídio regulado), Andrea Araújo disse que este é um problema decorrente do bloqueio em que está a contratação coletiva, de que a CGTP há anos protesta.

“Quando falamos em boicote na contratação coletiva não é só nos salários, é noutras cláusulas de expressão pecuniária”, como subsídio de refeição, afirmou.

Pela UGT, o secretário-geral adjunto, Sérgio Monte, disse que a central sindical gostaria que “todos os trabalhadores tivessem um subsídio de refeição e de valor substancial” mas que “isso seria uma interferência na lei nas questões pecuniárias das empresas”.

O BE propôs, em 2020, tornar obrigatório o pagamento de subsídio de refeição para todos os trabalhadores, sejam do setor público ou privado, e que o valor pago aos trabalhadores do setor privado não seja inferior ao definido para os funcionários públicos (então de 4,77 euros por dia).

Em declarações ao Público, José Soeiro defendeu então que “a lei deve definir patamares mínimos” de direitos iguais para todos e recordou que o subsídio de Natal também só foi instituído na lei para todos os trabalhadores nos anos 1990, no governo socialista de António Guterres.

Para o PCP, esta é uma matéria do âmbito da negociação coletiva, disse então também ao Público, considerando que fixar o subsídio poderia levar a pressões das entidades patronais sobre o Governo para que não o subisse como acontece noutras matérias.

Para este ano, o PCP fez uma proposta na altura do Orçamento do Estado sobre o subsídio de refeição dos funcionários públicos, propondo que fosse fixado em 9,00 euros, considerando que este valor introduziria “justiça numa componente da remuneração que há vários anos não sofre qualquer atualização, não afastando nem substituindo a necessidade no imediato do aumento geral dos salários e da negociação com os sindicatos desta e de outras matérias pecuniária”, lê-se na proposta.

No início de 2023, por proposta do Governo aprovada no Orçamento do Estado, o subsídio de refeição foi atualizado de 4,77 euros para 5,20 euros. Já este mês, devido à alta inflação, o subsídio de refeição dos funcionários públicos passou para seis euros.

A Lusa contactou outros grupos parlamentares para conhecer propostas relativas ao subsídio de refeição, sem sucesso.

Em geral, o subsídio de alimentação é pago mensalmente nos 22 dias úteis de trabalho (ou seja, não é pago em férias, feriados, faltas ou outros dias não trabalhados). No caso de empresas com serviço de cantina e refeitório, estas podem dispensar o subsídio pelo fornecimento das refeições.

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