Tribunais

Tribunal reverte decisão do Governo e anula extinção da Fundação José Berardo

Notícias de Coimbra com Lusa | 2 anos atrás em 12-04-2023

O Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal anulou a extinção da Fundação José Berardo, revertendo assim a decisão tomada em julho de 2022 pelo Governo através de um despacho da Presidência do Conselho de Ministros.

Segundo a sentença a que a Lusa teve acesso, com data de segunda-feira, o tribunal entendeu que a extinção da fundação pelo despacho do secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, André Moz Caldas, assinado em 11 de julho de 2022, assentou em diversos vícios.

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Em causa estão a falta de competência do órgão administrativo para a decisão, a violação de um dever de audiência prévia e, sobretudo, o erro nos pressupostos da extinção, em especial o alegado desvio da instituição relativamente aos fins, sob o argumento de que a Fundação José Berardo visava essencialmente a atividade económico-financeira e era usada por Joe Berardo para gerir os investimentos.

“Não existe (…) obstáculo à aquisição, a título oneroso, por parte das fundações, de bens ou direitos com o objetivo de aplicar os rendimentos deles provenientes no reforço do património inicialmente afetado à prossecução dos seus fins”, lê-se na decisão, que acrescenta: “O desvio de fim verificar-se-á quando (…) existe na própria essência do instituto um vício de raiz, uma inclinação oculta para fins diferentes dos ostensivamente consagrados”.

O juiz Eurico Gomes salientou que o relatório da auditoria da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) – que serviu de base à decisão de extinção – centrou a análise na gestão patrimonial e na situação económico-financeira da fundação entre 2007 e 2018, apesar de esta entidade ter sido criada em 1988 e formalmente reconhecida no final do ano seguinte. Por isso, argumentou que apenas se analisaram 12 dos 32 anos de existência da Fundação José Berardo, nomeadamente o período entre 2015 e 2017.

“Ainda que as situações de facto identificadas no relatório de auditoria possam consubstanciar a prática, por parte do órgão de gestão, de vários atos em violação do dever de prudência na gestão dos recursos patrimoniais da fundação e em violação dos fins estatutários (…), a verdade é que (…) não se pode afirmar que a atividade globalmente desenvolvida pela Fundação requerente, durante os seus 32 anos de existência, se desviou, de forma permanente, reiterada e sistemática, dos fins de interesse social”, referiu.

Sobre os outros vícios, o juiz entendeu sobre a falta de competência para a extinção que, “ao praticar o ato impugnado, o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros exerceu uma competência alheia, sem que estivesse habilitado para esse efeito”.

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Já em relação à violação do dever de audiência prévia, o tribunal explicou que os argumentos para dispensar a audiência prévia da fundação com vista a acautelar a execução da extinção não permitiam tirar essa conclusão, tornando o respetivo despacho ilegal.

“Nos termos e com os fundamentos expostos, julgo procedente a ação e, em consequência, anulo o despacho do Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, de 11.07.2022”, concluiu.

Confrontado pela Lusa com esta decisão, o advogado da Fundação José Berardo, Paulo Saragoça da Matta, limitou-se a manifestar “apreço pelo facto de o Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal ter tido coragem de fazer Justiça, mesmo neste ambiente adverso”, recusando fazer mais declarações.

A extinção da Fundação José Berardo foi declarada na sequência do relatório da Inspeção-Geral das Finanças, de 2019, no âmbito da Lei-Quadro das Fundações e efetivou-se porque “as atividades desenvolvidas [por esta instituição] demonstram que o fim real não coincide com o fim previsto no ato de instituição”, como definia o despacho assinado pelo secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, André Moz Caldas.

A Fundação José Berardo, criada no Funchal em 1988, foi um instrumento na gestão dos negócios do empresário, através da qual contraiu dívida, nomeadamente para a aquisição de ações do Millennium BCP, estando na base de processos judiciais contra o empresário madeirense.

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