Tribunais

Pedrógão Grande: Advogado critica “acusação por atacado” do Ministério Público

Notícias de Coimbra com Lusa | 2 anos atrás em 30-05-2022

O advogado do funcionário da Ascendi Ugo Berardinelli criticou hoje, no julgamento sobre os incêndios de Pedrógão Grande, a “acusação por atacado” do Ministério Público, ao atribuir iguais responsabilidades aos arguidos da empresa com distintas funções.

“No que respeita aos arguidos Ugo Berardinelli, José Revés e Rogério Mota, o Ministério Público (MP) faz uma acusação por atacado, não os responsabiliza pessoalmente, mas enquanto colaboradores no seu conjunto da Ascendi, à semelhança do que fez em relação aos colaboradores da EDP [atual E-REDES]”, afirmou Leopoldo Camarinha, no Tribunal Judicial de Leiria, nas alegações finais do julgamento para determinar eventuais responsabilidades criminais nos incêndios de Pedrógão Grande, em junho de 2017.

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Segundo Leopoldo Camarinha, “são atribuídas as mesmas obrigações, as mesmas competências”, apesar de os três arguidos terem “competências, funções distintas, como é óbvio”.

Ugo Berardinelli era responsável pela Direção de Operação e Manutenção da Ascendi Pinhal Interior, cabendo-lhe “providenciar pela criação e manutenção da faixa de gestão de combustível” na Estrada Nacional (EN) 236-1 e “fiscalizar a sua boa execução”.

A EN 236-1 liga Castanheira de Pera a Figueiró dos Vinhos. Foi nesta via que foi encontrada a maioria das vítimas mortais dos incêndios de Pedrógão Grande, em junho de 2017.

A subconcessão rodoviária do Pinhal Interior, que integrava esta via, estava adjudicada à Ascendi Pinhal Interior, à qual cabia proceder à gestão de combustível.

Ugo Berardinelli responde por 34 crimes de homicídio e sete de ofensa à integridade física, cinco deles graves, todos por negligência, os mesmos crimes imputados a outros dois funcionários da Ascendi, que não efetuaram, “por si ou por intermédio de outrem, ao corte/decote das árvores e vegetação existentes nos terrenos que a ladeavam, em conformidade com o legalmente estipulado e conhecendo a obrigatoriedade de o fazer”.

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Assim, agiram “sem o cuidado devido, por imprevidência e imprudência, omitindo os procedimentos elementares necessários à criação/manutenção da faixa de gestão de combustível naquela via”.

Nas alegações finais, o Ministério Público pediu prisão efetiva para os três funcionários, considerando que “devem ser condenados pelos crimes de que vêm acusados em pena de prisão superior a cinco anos”.

Leopoldo Camarinha classificou a acusação de “injusta, totalmente desprovida de sentido” e “desligada da realidade da tragédia que ocorreu em 17 de junho de 2017”.

“Perante as evidências probatórias em sede de julgamento (…) não compreendo o pedido de condenação, muito menos o pedido de condenação a prisão efetiva”, declarou o causídico, acreditando que no julgamento se fez prova esmagadora da inocência dos arguidos”.

O causídico adiantou que a acusação radica em “claros equívocos”, sendo que um deles é o de que o engenheiro Ugo Berardinelli não cortou ou mandou cortar vegetação numa faixa de gestão de 10 metros de cada lado naquela estrada.

“Se este é o sentido da acusação e da pronúncia, há uma questão prévia e absolutamente essencial que é saber se a obrigação de gestão de combustível era ou não aplicável à Ascendi”, disse.

Para o causídico, “à data dos factos a obrigação não era aplicável à Ascendi” porque Pedrógão Grande não tinha Plano Municipal da Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI), pois tinha caducado.

“Mas apesar da caducidade manifesta do plano, nem o MP nem o juiz de instrução criminal veio tirar as necessárias e legais consequências”, lamentou, defendendo que, “sem plano, não há gestão de combustível”, pois aquele definia onde fazer, quando fazer e o que fazer.

Se essa obrigação não existia, também não podia recair sobre o arguido Ugo Berardinelli esse dever, continuou o advogado.

E ainda que por mera hipótese a Ascendi estivesse sujeita à criação da faixa de gestão de combustível, isto é insuficiente para “responsabilizar criminalmente” o arguido, que não tinha competências nem podia autorizar a aquisição de serviços para a gestão de combustível nas concessões e subconcessões, incluindo na EN 236-1, nem tinha a incumbência de fiscalização.

Elencando a troca de correspondência entre o arguido e a Comissão Executiva da Ascendi, o causídico referiu que esta, “louvando-se num parecer do Departamento Jurídico da empresa”, emanou uma orientação, que manteve até aos incêndios de Pedrógão Grande, segundo a qual “nos concelhos em que existisse PMDFCI em vigor” a faixa de gestão de combustível era de 10 metros e nos outros três metros, “em conformidade” com o manual de procedimento da concessionária, Ascendi, aprovada pela concedente, hoje Infraestruturas de Portugal.

“O que é que o arguido mais deveria ter feito? (…) Com que meios? A expensas suas?”, perguntou o advogado, que pediu a absolvição.

Em causa neste julgamento, com 11 arguidos, estão crimes de homicídio por negligência e ofensa à integridade física por negligência, alguns dos quais graves. No processo, o Ministério Público contabilizou 63 mortos e 44 feridos quiseram procedimento criminal.

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