Economia
Pandemia, TAP e SATA são os culpados do défice em 2020
Mais de metade do défice de 5,7% das contas públicas registado em 2020 deve-se ao impacto orçamental das medidas de resposta à pandemia e de apoio financeiro à TAP e SATA, segundo o Conselho de Finanças Púbicas (CFP).
No relatório “Evolução orçamental das Administrações Públicas em 2020”, hoje divulgado, o CFP sustenta que “a deterioração do saldo das AP [Administrações Públicas] em 2020 deveu-se em mais de metade ao impacto orçamental direto das medidas de resposta à crise pandémica (2,3% do PIB) e às medidas de apoio financeiro às companhias aéreas de transporte TAP Air Portugal e SATA Air Açores (0,7% do PIB)”.
Em 2020 registou-se o empréstimo de 1.200 milhões de euros à TAP, enquanto as garantias prestadas pelo Governo Regional dos Açores à SATA Air Açores foram de 132 milhões de euros.
O défice de 5,7% registado em 2020 segue-se ao excedente de 0,1% registado no ano anterior, mas foi ainda assim inferior ao antecipado no Orçamento retificativo de 2020 (que apontava para um saldo de -7,0%) e que o antecipado na proposta do Orçamento do Estado para 2021 (-7,3%).
A deterioração do cenário macroeconómico provocado pela crise pandémica foi o principal fator explicativo do agravamento do saldo das contas públicas, “a que acresceu em menor grau a ação da política discricionária, que reflete em grande parte as medidas excecionais de apoio ao emprego e à economia adotadas pelo Governo na resposta à crise pandémica”, refere o CFP, notando que os encargos com os juros da dívida beneficiaram em 0,1 pontos percentuais a variação do saldo.
A análise do Conselho de Finanças Públicas à evolução da execução orçamental em 2020 sublinha que os impactos das medidas de resposta à crise pandémica tiveram expressão do lado da receita e da despesa e também ao nível dos passivos contingentes, através das garantias concedidas a outros setores da economia.
“As AP concederam garantias no montante de 7.160 milhões de euros em 2020, mais 6.212 milhões de euros do que em 2019”, refere o documento, sublinhando que “a eventual materialização de parte deste passivo contingente pode implicar no futuro despesa pública, com consequências no saldo e na dívida pública”.
No que diz respeito ao impacto orçamental no imediato das medidas de resposta à pandemia, mais de três quartos traduziram-se num aumento da despesa (ascendendo a 3.562,2 milhões de euros, o equivalente a 1,7% do PIB), com o ‘lay-off’ simplificado a corresponder a 823,2 milhões de euros.
O restante impacto resultou numa redução de receita de 1.076,9 milhões de euros, incluindo aqui, por exemplo, as isenções das contribuições para a Segurança Social dadas às empresas e a suspensão dos pagamentos por conta.
O documento refere também que a receita pública registou em 2020 um decréscimo de 5,0% (abaixo da queda de 5,4% do PIB nominal), o que fez com que o rácio da receita das administrações públicas em relação ao PIB tenha aumentado em 0,2 pontos percentuais, para 42,8%, face a 2019.
“Em termos absolutos, a receita das administrações públicas reduziu-se 4.575 milhões de euros determinada, maioritariamente, pela receita fiscal e contributiva, e mais concretamente pela receita de impostos”, refere o CFP, detalhando que cerca de quatro quintos deste decréscimo da receita fiscal ficou a dever-se ao comportamento da receita dos impostos indiretos (que incidem sobretudo sobre o consumo), que caiu 9,1%.
Os impostos diretos (categoria na qual se incluem o IRS e o IRC) registaram um comportamento menos desfavorável, caindo 3,7% face a 2019, ‘arrastados’ pela queda do imposto que incide sobre os lucros das empresas, já que o IRS terminou o ano com uma variação positiva de 3,1%.
A subir estiveram também as contribuições sociais, que registaram um crescimento anual de 1,2%, explicado pelo comportamento das contribuições sociais efetivas.
“A contração do PIB nominal a um ritmo mais pronunciado do que o da receita dos impostos diretos, bem como o aumento das contribuições sociais efetivas num contexto macroeconómico recessivo, elevou a carga fiscal das AP em 0,3 p.p. do PIB, ascendendo este indicador a 34,6% do PIB no ano de 2020”, refere o relatório.
Relativamente à despesa pública, o CFP indica que o crescimento deste agregado acelerou de 2,5% em 2019 para 7,8% em 2020, tendo registado em termos absolutos um aumento de 7.103 milhões de euros face a 2019.
Cerca de metade deste aumento deveu-se ao impacto das medidas de resposta à pandemia, com o organismo liderado por Nazaré Costa Cabral a referir que no caso das despesas com pessoal se registou um novo aumento, o que acontece pelo quinto ano consecutivo o que coloca o seu valor total (23.744 milhões de euros) próximo do “valor máximo absoluto atingido no ano de 2010” (24.576 milhões de euros).
Em 2018 e 2019, as despesas com pessoal representaram 10,7% do PIB, tendo aumentado para 11,7% do Produto em 2020. Em valor, o aumento de 838 milhões de euros em 2020 (3,7%) foi semelhante ao de 2019 (876 milhões de euros), sendo cerca de três quartos justificado pelo acréscimo com ordenados e salários.
Ainda assim, “a despesa pública ficou 1.332 milhões de euros abaixo do valor” previsto no OE/2020 revisto, “um desvio favorável para o qual contribuíram a despesa corrente primária (nomeadamente o consumo intermédio, as prestações sociais e a “outra despesa corrente) e, em menor grau, os encargos com juros”.
A despesa de capital totalizou 8.355 milhões de euros, registando um acréscimo de 2.103 milhões de euros face a 2019, dos quais 1.663 milhões vêm de ‘outras despesas de capital’, que incluem o empréstimo de 1.200 milhões de euros à TAP.
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