Coimbra
Covid-19: Bébécar encerrada devido a contágio e acusada de negligência por omitir casos
Em causa estão pelo menos as fábricas Bébécar (de carrinhos de bebé), Trama (de mobiliário infantil) e Texbébé (de têxteis para puericultura), três unidades que, nesse concelho do distrito de Aveiro, tinham anunciado que entrariam em regime de suspensão temporária da produção na próxima quarta-feira, mas acabaram por antecipar o fecho devido à nova doença.
“Terá sido a deteção de mais casos de covid-19 entre os trabalhadores que obrigou a empresa a encerrar as várias unidades do grupo, o que afeta cerca de 350 pessoas”, diz fonte oficial do Bloco de Esquerda (BE).
Um dos operários da Trama, que pediu à Lusa para não ser identificado por receio de represálias, revelou: “A mulher de um patrão estava contaminada e ele também fez o teste, mas, em vez de esperar em casa até saber o resultado, continuou a vir trabalhar para a fábrica e agora o exame dele deu positivo”.
Outro funcionário, que também pede para o seu nome ser omitido, acrescenta: “O pessoal está revoltado porque ainda na quarta-feira esse patrão esteve com todos os funcionários da fábrica, um a um, a assinar os papéis para o ‘lay-off’. Ele estava com máscara, mas esteve sempre a menos de um metro de nós, a ver-nos assinar”.
Contactada pela Lusa, fonte oficial da Câmara da Feira diz que a autarquia ainda não tem informação sobre as circunstâncias que implicaram o encerramento antecipado das empresas da Bébécar, mas afirmou que, a comprovarem-se os factos relatados pelos operários, esse grupo empresarial e os próprios contaminados “incorrem no crime de propagação de doença contagiosa, previsto no Código Penal” e punível com pena de multa ou prisão até cinco anos.
Na Junta de Freguesia das Caldas de São Jorge, localidade onde estão instaladas as referidas empresas do Grupo Bébécar, o presidente, José Martins, confirmou que “há dois gestores contaminados com a covid-19 e um deles estava a trabalhar, mas tinha feito o teste 24 horas antes”.
Defendendo que “os trabalhadores estão chateados, sobretudo porque acham que as empresas já deviam ter fechado na semana passada”, o autarca considera que “quando o Governo declarou o estado de emergência, devia ter imposto uma emergência a sério, com as fábricas realmente fechadas, e também podia ter decidido que, de março a abril, seria período de férias para toda a indústria, para evitar prejuízos maiores”.
Ainda assim, José Martins critica a falta de sentido de responsabilidade que ainda nota na sua própria freguesia: “Não adianta de nada as fábricas fecharem para as pessoas irem para casa e, em vez de ficarem em verdadeiro isolamento, acharem que estão de férias e andarem por aí a passear na rua e nos passadiços, sem consciência nenhuma da gravidade da situação”.
Para a coordenação distrital do BE, a maior responsabilidade continua a recair sobre as empresas do Grupo Bebécar, considerando que “nenhum trabalhador terá sido sinalizado para isolamento profilático depois de confirmado o primeiro diagnóstico positivo entre o pessoal” e que, já antes disso, as fábricas “não colocaram gel desinfetante à disposição dos funcionários”.
O partido insiste, por isso, que “é preciso que se esclareçam as circunstâncias em que se deu o início desse surto, as medidas tomadas desde a identificação do primeiro caso, a existência ou não de um plano de contingência, o respeito ou não por regras como a distância entre trabalhadores e a existência ou não de materiais e meios para higiene e desinfeção”.
“É preciso ainda saber se os trabalhadores foram expostos ao novo coronavírus por negligência ou por desrespeito das regras a que a empresa estava obrigada pelo estado de emergência decretado devido à pandemia”, acrescenta o BE.
Exigindo que a situação seja verificada “não só pelas competentes autoridades de saúde, mas também pelas autoridades fiscalizadoras das condições de trabalho”, o BE já questionou os ministérios da Saúde e do Trabalho sobre a situação, realçando que “a Bébécar anunciou ‘lay-off’ por um mês com o argumento da suspensão e cancelamento de encomendas, mas prevê que esse prazo seja prorrogado após avaliação no final de abril”.
Funcionários das empresas alegam “falta de informação” sobre esses procedimentos e querem saber, por exemplo, “como é que vão ser pagos os dias desta semana em que já não houve trabalho, mas ainda não estava em vigor o ‘lay-off’, que só era para começar na próxima quarta-feira”.
A Lusa contactou as três empresas do grupo, mas nenhuma esteve disponível.
O novo coronavírus responsável pela pandemia de covid-19 foi detetado em dezembro na China e já infetou mais de 505.000 pessoas em todo o mundo, das quais cerca de 23.000 morreram.
Em Portugal, a Direção-Geral da Saúde indicou quinta-feira que o surto já provocou 60 mortes e 3.544 infetados.
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