“Posso e devo dizer que o único concorrente que efetuou abertamente essa pressão foi a Sonae. Dias antes da assembleia-geral o presidente do Conselho de Administração da Sonae, Dr. Paulo Azevedo, telefonou-me pedindo expressamente a intervenção do Governo para que a Caixa Geral de Depósitos [CGD] votasse a favor da Sonae. Reafirmei, nesse telefonema, a nossa posição de neutralidade”, lê-se nas respostas de Sócrates aos deputados da comissão de inquérito à recapitalização da e à gestão do banco, a que a Lusa teve acesso.
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Sócrates diz que nunca falou com o ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES), Ricardo Salgado, sobre a Oferta Pública de Aquisição (OPA) da Sonae, nem recebeu dele “nenhum pedido ou pressão sobre este assunto nem direta, nem indiretamente”, assim como não recebeu “qualquer quantia monetária ou outro qualquer bem” do grupo BES, da empresa Lena ou de qualquer outra empresa.
Sócrates afirma sentir-se ofendido com as perguntas sobre se foi corrompido e que isso mesmo sabem os deputados do PSD que o questionaram.
O ex-governante diz que a posição do seu governo sempre foi de que “deveria ser o mercado a decidir”, e isso mesmo ficou explícito na assembleia-geral em que o Estado se absteve.
Sobre o voto da CGD, que também era acionista da PT, diz Sócrates que “o governo não deu qualquer orientação à Caixa Geral de Depósitos nem a nenhum dos seus administradores” e que o banco público votou apenas tendo em conta o seu interesse.
Sócrates afirma mesmo que a relação do seu governo com a PT “foi sempre conflituante”, porque o executivo queria aumentar a concorrência no setor das telecomunicações, enquanto a PT queria manter o seu poder no setor.
A OPA da Sonae sobre a PT foi lançada em 2006 e terminou em 2007, sem sucesso.
O Estado absteve-se na votação da desblindagem de estatutos da PT mas a CGD, detida pelo acionista Estado, votou contra, considerando que a estratégia da administração da PT era a que mais valor criava para a empresa.
A posição do Estado naquele processo levou a fortes críticas do então líder da Sonae, Belmiro de Azevedo.
Ainda nas respostas aos deputados, Sócrates fala do caso BCP, dizendo que apenas acompanhou o que se passava pelos jornais e nunca fez qualquer sugestão para a administração do banco privado, negando qualquer conspiração política para tomar o poder na instituição.
“Nunca – repito, nunca – orientei, sugeri ou discuti com qualquer acionista do banco comercial português as escolhas a fazer para a sua administração. Nunca me reuni com acionistas ou grupos de acionistas para falar sobre a administração do BCP e também isso nunca me foi solicitado por qualquer dos envolvidos na disputa”, refere Sócrates.
Diz ainda que não sabia que a CGD tinha decidido dar crédito a acionistas do BCP e que “nem tal assunto foi alguma vez discutido dentro do governo” ou com o ministro das Finanças. Aliás, afirma, só em final de 2007 lhe foi comunicado que Armando Vara aceitou o convite de um grupo de acionistas para integrar uma lista de candidatos à gestão do banco.
Sobre Berardo, diz que nunca falou com ele sobre investimentos e que só reuniu com ele uma vez, em 2007, “a pedido da então ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, para discutir a possibilidade de um acordo entre o Estado e a Fundação Berardo para que a sua coleção fosse exposta no Centro Cultural de Belém”.
Sócrates diz ser “vazia de evidências” a ideia da conspiração entre governo e Banco de Portugal, então liderado por Vítor Constâncio.
“A história de um conluio entre mim, o ministro das Finanças e o governador do Banco de Portugal não passa de uma tese mal intencionada e desesperada que visa por um lado desviar as atenções dos problemas causados ao BCP por parte de quem a invoca e que, por outro lado, tem o propósito de atacar covardemente o meu governo”, afirma Sócrates, acrescentando que os “únicos responsáveis pelo empréstimo ao senhor José Berardo são os administradores da Caixa Geral de Depósitos”.
Sócrates diz que esta comissão de inquérito desde início definiu alvos a atacar e que até os deputados do PS têm alinhado nisso, caso das críticas ao ex-líder socialista e ex-governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio.
“Desde inicio, a Comissão definiu os seus alvos. Na verdade, há muito que Vítor Constâncio o é dos partidos da direita, a diferença agora é que se tornou o alvo de todos – incluindo daquele de quem foi secretário-geral e que o ataca tão injustamente como todos os outros”, afirma.
Por fim, também qualquer intervenção sua no projeto da espanhola La Seda em Sines é rebatida, referindo que nunca contactou com qualquer administrador da CGD para interceder pelo financiamento do projeto nem se reuniu com promotores da fábrica.
Refere mesmo que “jamais o Governo deu qualquer tipo de orientação à Caixa sobre projetos de potencial interesse nacional, nem sobre setores económicos ou mercados a privilegiar”.
A Sonae “nunca pressionou, nem tentou obter tratamentos especiais”, disse hoje à Lusa fonte oficial, depois de o ex-primeiro-ministro José Sócrates ter acusado o presidente do grupo de pressão no caso da OPA lançada sobre a PT.
“Estas não são acusações novas e, como é óbvio, a Sonae nunca pressionou nem tentou obter tratamentos especiais, exige sim ser tratada com lisura e equidade”, afirmou fonte oficial do grupo liderado por Cláudia Azevedo (irmã de Paulo Azevedo) desde final de abril.
“Os argumentos que a empresa esgrimiu em defesa do seu plano aconteceram no âmbito do processo organizado pelo próprio governo, que pretendia comparar os benefícios dos dois projetos, tendo sido expressamente convocada para este efeito”, prosseguiu fonte oficial da Sonae, que considerou que “os argumentos que utilizou neste processo foram exatamente os mesmos que utilizou publicamente”.