Justiça
Magistrados dizem em Coimbra que o controlo político do Ministério Público abre a porta à tirania
O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) alertou hoje, em Coimbra, que o controlo político do Ministério Público (MP) “abre a porta à tirania”, como já acontece noutros países europeus.
“Em alguns países da Europa, como consequência de derivas autoritárias, temos visto a utilização dos conselhos das magistraturas como forma privilegiada de atacar a independência e autonomia das magistraturas”, disse o presidente do SMMP, António Ventinhas.
O dirigente sindical intervinha na abertura de uma conferência intitulada “Conselhos superiores, independência e autonomia das magistraturas”, realizada na Casa do Juiz, por iniciativa do SMMP e da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP).
“Permitir o controlo político do MP abre a porta à tirania e ao fim da democracia, como se comprova noutros países”, afirmou, sublinhando que “estes ataques não prejudicaram somente os magistrados, mas essencialmente desferiram um forte golpe na democracia”.
António Ventinhas lembrou que “os padrões internacionais apontam no sentido de existir uma gestão das magistraturas efetuada por uma maioria de magistrados”.
“O modelo consolidado de Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) que existe é mantido na atual proposta de lei do Governo, o que reputamos como positivo. Quando um modelo funciona durante mais de duas décadas é preciso que existam razões muito fortes para que o mesmo mude e até agora não vimos factos que imponham uma alteração substancial”, disse.
Na sua opinião, “também é significativo” que a atual ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, e a sua antecessora, Paula Teixeira da Cruz, “defendam o mesmo modelo, como garantia de autonomia” do Ministério Público.
“O que deveria ser mais aperfeiçoado no Estatuto do Ministério Público prende-se com o regime dos membros não magistrados. Na verdade, há situações no presente e no passado que têm prejudicado o funcionamento do conselho”, lamentou.
O presidente do SMMP disse que “as incompatibilidades, o absentismo e o facto de alguns membros não magistrados não relatarem os processos que lhe foram distribuídos contribuem para uma menor produtividade e têm prejudicado vários magistrados”.
“Por outro lado, deveria ser ponderada uma limitação de mandatos dos membros não magistrados, à semelhança do que sucede para os magistrados”, preconizou.
António Ventinhas enfatizou que “sempre os espíritos autoritários quiseram dominar e controlar a investigação criminal, instrumentalizando a mesma para os fins que lhes interessam”.
“O meio de atingir tal fim passa sempre pelo controlo do procurador-geral da República ou do Conselho Superior do Ministério Público”, acentuou.
Por seu turno, o presidente da ASJP, Manuel Soares, mencionou no seu discurso a Polónia e a Hungria como exemplos de países da União Europeia onde esta situação se verificou.
“Os juízes não querem que se recue no que foi bem feito. A todos nos orgulha trabalhar num sistema que responde com mais eficiência e é capaz de manter o mesmo padrão de qualidade”, referiu.
Neste contexto, Manuel Soares realçou que “os juízes deram há pouco tempo um sinal muito expressivo de rejeição de modelos de gestão que funcionalizam e automatizam, em que os conselhos se transformam numa espécie de direções gerais dos juízes, que governam o sistema de forma hierárquica, com circulares e provimentos vinculantes, executados pelos presidentes de comarca, transformados numa espécie de diretores regionais”.
“Isso os juízes não querem nem aceitam e para isso podem contar com uma associação cooperante e responsável, mas também vigilante e exigente”, concluiu.
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