Economia
Setor bancário passou a concentrar acumulação de capital em Portugal
A banca passou a concentrar os processos de acumulação de capital em Portugal, à semelhança do que aconteceu a nível internacional, tendo o país enveredado por um modelo de “financeirização híbrida”, referiu um relatório hoje divulgado.
Segundo o primeiro relatório – ainda preliminar – do Observatório sobre Crises e Alternativas do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, “o setor bancário, agora essencialmente privatizado, tornou-se o centro da acumulação de capital em Portugal, alimentando setores sobre os quais detinha um elevado controlo das cadeias de produção e provisão, nomeadamente no setor do imobiliário”.
A ser apresentado na quarta-feira na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, o documento refere que Portugal assistiu a um processo de “financeirização híbrida”, ou seja, “a integração financeira da economia portuguesa processou-se como se de uma economia do centro se tratasse”, enquanto, por outro lado, “esta mesma integração retirou-lhe os mecanismos de ajustamento para fazer face a choques externos, como a desvalorização cambial”.
“A financeirização permitiu durante algum tempo ‘incrustar’ socialmente o neoliberalismo em Portugal, ou seja, permitiu compatibilizar uma intervenção pública no campo do desenvolvimento das capacidades individuais e coletivas com o processo de liberalização”, referem os autores do primeiro capítulo, sobre “Compreender a crise: A economia portuguesa num quadro europeu desfavorável”.
O relatório recorda que, no ano passado, a riqueza criada em Portugal atingiu os 155,3 mil milhões de euros, menos 9,4 mil milhões do que em 2007, “o ano do valor mais elevado alguma vez atingido”, o que significa que “5,7% da riqueza que o país tinha mostrado que era capaz de criar desapareceu”.
“Na verdade, estamos perante o quadro incontornável do empobrecimento deliberado, da veiculação do pressuposto ideológico de que é preciso sujeitar a economia a uma regressão na base da qual se possam redefinir relações tanto económicas como sociais. Isto é, a austeridade hostiliza ou pelo menos desconhece a ideia básica de que uma economia, se precisar de ajustamentos, os pode e deve fazer num quadro de salvaguarda do que se adquiriu. Acontece, de facto, que o empobrecimento é o instrumento privilegiado da austeridade”, pode ler-se no relatório.
De acordo com o documento, “a aposta no crédito às famílias e no sector do imobiliário é partilhada, sendo central nas dinâmicas de endividamento privado e no crescente peso do setor financeiro”, sendo que Portugal “não é exceção”, mas “apresenta características típicas de um país semiperiférico, como sejam a preponderância da banca e o papel mais marginal dos mercados de capitais”.
“Processos de reestruturação da dívida com profundas perdas para os credores, e não apenas limitadas ao setor público, surgem como uma alternativa quase inevitável face ao peso do endividamento total nacional. Contudo, tal passo terá de ser acompanhado por uma mudança estrutural da economia portuguesa, que inclui a correção das disfunções do sistema financeiro doméstico e a alteração dos termos da integração europeia”, conclui.
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