Há números que falam mais alto do que quaisquer palavras e quando se trata dos cuidados paliativos em Portugal, eles traduzem uma realidade alarmante, em que 70% dos doentes não têm acesso a cuidados paliativos em tempo útil, percentagem que, no caso das crianças, chega aos 90%.
Dados que são do conhecimento dos decisores que, no entanto, os parecem ignorar no momento da implementação de medidas. O mais recente exemplo é a Portaria 156/2025/1, que regula a criação do projeto-piloto das Equipas de Cuidados Continuados Integrados, que a Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos (APCP) quer ver alterada, uma vez que não inclui a articulação com as equipas especializadas de suporte em Cuidados Paliativos (comunitárias e domiciliárias), o que contradiz a legislação atual.
Por esse motivo, a APCP acaba de remeter à Comissão parlamentar da Saúde, à Direção Executiva do SNS e ao Coordenador da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados um pedido de alteração ao documento, uma vez que se centra no papel das Equipas de Cuidados Continuados Integrados (domiciliários), ignorando a articulação com as Equipas Comunitárias de Suporte em Cuidados Paliativos e com Equipas Domiciliárias de Suporte em Cuidados Paliativos de adultos e Pediátricas.
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De acordo com a presidente da APCP, a enfermeira Catarina Pazes, “a omissão pela portaria constitui não apenas uma desconformidade regulamentar, como também um potencial retrocesso normativo face ao princípio da continuidade de cuidados consagrado na Lei de Bases dos Cuidados Paliativos”. E reforça que esta situação “compromete a prestação de cuidados paliativos a doentes com necessidades paliativas de maior complexidade em contexto domiciliário”.
Segundo a Associação, daqui podem resultar lacunas na assistência prestada aos doentes em fim de vida, para os quais o modelo integrado e domiciliário é fundamental.
O papel das Equipas de Cuidados Continuados Integrados é essencial na prestação de cuidados aos doentes com necessidades paliativas no domicílio, sendo também imprescindível a integração de cuidados com as Equipas especializadas que operam na comunidade. É, por isso, urgente que a portaria seja revista e complementada, uma correção legislativa que vai “garantir a coerência do sistema, a qualidade dos cuidados prestados, o cumprimento dos princípios jurídicos da continuidade e integralidade dos cuidados de saúde”.
A presidente da APCP recorda que não existe um compromisso com os cuidados paliativos em Portugal, que “permita equidade no acesso a cuidados de qualidade promotores de dignidade e qualidade de vida em momentos que são de grande fragilidade provocada pela doença grave”.
Perante o que considera o estado de insuficiência extrema e as graves desigualdades no acesso a cuidados paliativos em Portugal, a APCP entregou recentemente à Secretária de Estado da Saúde e à Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde um memorando com um conjunto de medidas a implementar, entre as quais: “urgência na alocação dos recursos humanos mínimos necessários (médico, enfermeiro, psicólogo e técnico de serviço social) em todas as equipas de cuidados paliativos, incluindo nas equipas pediátricas” e “condições imediatas para que os profissionais que trabalham nas Equipas de Cuidados Paliativos possam desenvolver as competências adequadas ao trabalho especializado e se possam fixar nestas Equipas”.
Assim como, “condições para a criação de resposta efetiva em cuidados paliativos pediátricos” e “formação pré-graduada em cuidados paliativos obrigatória nos cursos de Medicina, Enfermagem, Psicologia e Serviço Social”.
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